Já tínhamos saudades de Virginia Astley e da música que nos devolve os lugares tranquilos e seguros. Precisamente quatro décadas depois de From Gardens Where We Feel Secure («Dos jardins onde nos sentimos seguros»), chegam-nos estes The Singing Places («os lugares que cantam», ou «os lugares onde se canta»). A capa leva-nos a um fim de tarde outonal algures no campo, entre memórias de infância ou de férias. É Kelmscott, explicou Virginia, onde o escritor inglês William Morris viveu, «o seu paraíso na Terra». A música traz-nos aves migratórias ou pássaros das árvores vizinhas, sinos de uma abadia, riachos que correm, chuva, flautas campestres, animais que falam... São lugares que cantam, lugares que a compositora britânica refere como tendo «uma ressonância particular – emocional ou acústica, ou ambas!» Não há palavras neste disco, mas Virginia prometeu, a uma pergunta do 7Margens durante a audição do disco, em meados de Outubro, que é possível voltar a fazer uma obra como Hope in a Darkened Heart («Esperança num coração sombrio»), de 1986, que teve a participação de David Sylvian e Ryuichi Sakamoto. Também não há ainda edição física, mas ela não demorará. Mas tudo isso é secundário quando se escutam estes rumores de vida, registados ao longo do curso superior do Tamisa, que a artista depois envolveu de música. Rumores que nos deram esta música.
Título: The Singing Places
Autora e intérprete: Virginia Astley
Disponível na página da artista na plataforma
Bandcamp: https://virginiaastley.bandcamp.com
Esta música acontece por causa da proibição de outra: na Espanha do século XVI, os responsórios de Natal foram sendo substituídos por vilancicos em castelhano, marcados por uma «maior permissividade» nos textos e no estilo, como explica Marcelino Díez Martínez na apresentação deste disco. Com o tempo, as orações de matinas, nas catedrais, tornam-se um espectáculo, ao qual se assistia também pelo olhar divertido sobre o quotidiano que incluíam. Nas últimas décadas do século XVIII, há a reacção oposta e os vilancicos começam a ser proibidos, regressando a prática dos responsórios em latim. Este disco mostra-nos essa fase: mestre-de-capela da Catedral de Cádis, Juan Domingo Vidal (1734-1808) assumiu a tarefa de criar responsórios de Natal. Volta-se sobretudo ao latim e ao poema de inspiração bíblica ou litúrgica. Os primeiros foram um sucesso e «muito celebrados». A avaliar por aquilo que escutamos neste disco – que abre com o Magnificat e fecha com o Benedictus – podemos dizer que também os que se seguiram. A diversidade polifónica e instrumental, patente, por exemplo, no tema que dá título ao disco, mas também em vários outros, é de uma grande riqueza.
Título: Quem vidistis, pastores?
Autor: Juan Domingo Vidal
Intérpretes: Conjunto Vocal e Instrumental Virelay; dir.Jorge Enrique García Ortega
Edição: Bujio | conjuntovocalvirelay@gmail.com