Música de solidariedade contra o esquecimento – Caminhos de Exílio e Esperança é a ideia definidora deste disco, um trabalho que traduz o entendimento de Jordi Savall ao longo da sua já longa carreira e centenas de discos gravados: ver a música como expressão estética que implica uma ética. O projecto (pedagógico e artístico) nasceu em 2017, estendendo-se até ao ano seguinte, explica Savall, «como uma iniciativa social e cultural para apoiar» e integrar jovens músicos profissionais refugiados e imigrantes na Europa que tinham sido acolhidos em várias cidades da Europa.
Com a colaboração de dois «excepcionais» músicos sírios, Waed Bouhassoun e Moslem Rahal, o maestro catalão criou um programa original, se bem que construído a partir de múltiplos discos anteriores. Um programa em forma de rota musical, que inclui músicas de origens tão diversas como o Bangladesh, Curdistão, Afeganistão, Síria, Iraque, Líbano, Israel, Grécia, Marrocos, Tunísia e ainda da tradição judaica sefardita e uma improvisação sobre uma peça de Michael Praetorius (século XVII), conhecido pelo seu trabalho de composição de hinos luteranos. «Magníficos músicos» da Síria, Bangladesh, Bielorrússia, Marrocos e Turquia juntaram-se a Jordi Savall e ao seu Hespèrion XXI e oferecem-nos este disco que regista um espectáculo ao vivo, gravado em 10 de Março de 2019, em Paris.
A diversidade do programa e de origens dos músicos resulta num raro percurso até «à luz que amanhece sempre no Oriente» feito de uma extraordinária multiplicidade de sons, vozes, formas de expressão ou instrumentos, mas que, ao mesmo tempo, aparecem como uma linguagem unificada. E que revela a «luz espiritual que emana das ideias e das tradições culturais e espirituais das antigas civilizações do Próximo e do Extremo Oriente». Um percurso que vai, em crescendo, do Bangladesh a Marrocos, da tradição judaica à muçulmana, passando pela cristã ou yazidi, até às duas peças finais.
O disco expressa as diferentes sonoridades musicais, originárias da grande bacia mediterrânica, de que o músico tem sido um buscador incansável e que o levam, uma vez mais, a colocar o problema ético: «Muitos [dos músicos], que hoje são obrigados a tornar-se refugiados ou imigrantes na nossa Europa demasiado medrosa e pouco generosa, são portadores de uma memória não escrita, de uma cultura musical rica e em vias de desaparecimento. Porque essa cultura provém de regiões que, durante muitos anos, foram devastadas por guerras terríveis, pelo terror cego ou pelo colonialismo selvagem.»
Editado pouco antes do início da tragédia de Gaza, Savall diz que o disco homenageia também as vítimas da guerra na Síria, que em doze anos já fez mais de 570 mil mortos, seis milhões de deslocados internos e cinco milhões de refugiados no estrangeiro. Pode a música despertar-nos da letargia?
Título: Oriente Lux
Autor: Orpheus 21, Waed Bouhassoun, Moslem Rahal, Hespèrion XXI; dir. Jordi Savall
Edição: Alia Vox | Disponível nas plataformas digitais