Podem os números esconder significados? Sete salmos, sete andamentos, 33 minutos. Sete dias da criação, perdoar 70 vezes sete, os 33 anos que a tradição aponta à vida de Jesus... Podem ser só acasos, mas não o é a aproximação de Paul Simon à Bíblia, forte inspiração para outros grandes da música anglo-saxónica (apenas uma curtíssima lista: Pete Seeger, McCartney, Peter Gabriel, Bono Vox, Leonard Cohen, Jan Anderson ou Bob Dylan, que editou um novo disco pleno de referências bíblicas). Nesta música feita oração (ou oração vertida em música?) Simon confessa que tem «estado a pensar na grande migração– Espera Não estou pronto Estou só a arrumar as minhas coisas». Faz como que uma profissão de fé – ou testamento espiritual: «O Senhor é a terra em que corri / O Senhor é uma refeição para os mais pobres dos pobres / Uma porta de entrada para o estrangeiro / O Senhor é a música que eu ouço...» Confessa angústias e alegrias: «Vivi uma vida de agradáveis tristezas / / Até que chegou a questão verdadeira / Sou uma criança de novo, entrelaçada No teu amor Na tua luz. [...] Estamos todos a caminhar pela mesma estrada / Vive no coração e canta para todos O teu perdão.» E a entrega final: «A vida é um meteoro Deixa os teus olhos vaguearem O céu é lindo É quase como um lar Filhos, preparem-se, Está na altura de voltar a casa.» Belo mistério da fé, belíssimo mistério da música.
Título: Seven Psalms
Autor: Paul Simon
Edição: Owl / Legacy
Disponível nas lojas e plataformas digitais
O disco abre com o tema que lhe dá título – ¡A mi enamoradito, señores! – dedicado ao Santíssimo Sacramento. Jubiloso, vivo, “segura-o, que vai entre as flores, que se esconde entre o trigo”. O autor é Francisco Losada, mestre-de-capela em Cádis, entre 1656 e 1667, de cuja catedral provêm as peças aqui reunidas. A riqueza musical do disco continua com quatro vilancicos (dois para o Corpo de Deus, manifestação do superlativo catolicismo andaluz; e dois para o Natal); e três salmos da oração de vésperas, com os quais se reconstruiu as vésperas da festa do Sagrado Coração de Jesus, assinalada este ano em 9 de Junho. Os três salmos evidenciam como a capital gaditana foi, antes do século XVIII, uma escola de “múltiplas formas” de cantar os Salmos, incluindo o cantochão ou a improvisação polifónica, como recorda a apresentação do disco. As três peças, cantadas a 6, 7 e 8 vozes, confirmam os tesouros que temos ainda para descobrir na música antiga. Neste caso concreto, devemos a Máximo Pajares Barón (1925-2014), que foi também mestre-de-capela da catedral de Cádis (1952-1984) o laborioso levantamento da obra de Losada. Uma pérola.
Título: Francisco Losada - ¡A mi enamoradito, señores!
Intérpretes: Conjunto Vocal e Instrumental Virelay e Capilla de Música de la Catedral de Cádiz
Edição: Bujio | www.catedraldecadiz.com