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28 julho 2024

Na velhice não me abandones

Tempo de leitura: 6 min
A Igreja Católica celebra no dia 28 de Julho o IV Dia Mundial dos Avós e Idosos, que este ano tem como tema Na velhice não me abandones, que evoca a fervorosa súplica ao Senhor para não sermos deixados sozinhos na idade avançada.
Redacção
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Na mensagem para o Dia Mundial dos Avós e Idosos, o Papa Francisco, recorrendo à sua experiência pastoral e à sua condição de idoso, assinala que «a incómoda companheira da nossa vida de idosos e avós é, com frequência, a solidão. Muitas vezes me aconteceu, como bispo de Buenos Aires, ir visitar lares de terceira idade, apercebendo-me de como raramente recebiam visitas aquelas pessoas: algumas, há muitos meses, não viam os seus familiares», refere, no texto intitulado Na velhice não me abandones, passagem do Livro dos Salmos (Sl 71, 9). 

Solidão e descarte

As causas da solidão, alerta Francisco, são numerosas. Mas é claro é que «a solidão e o descarte se tornaram elementos recorrentes no contexto em que estamos imersos». E têm múltiplas raízes: «nalguns casos, são o resultado de uma exclusão planeada, uma espécie de triste “conjura social”; noutros, trata-se infelizmente de uma decisão própria; noutros ainda, suportam-se fingindo que se trata de uma opção autónoma. Cada vez mais “perdemos o gosto da fraternidade” (Francisco, Fratelli tutti, 33)
e sentimos dificuldade até para imaginar algo diferente». 

O papa lembra que «a solidão e o descarte dos idosos não são casuais nem inevitáveis, mas fruto de opções – políticas, económicas, sociais e pessoais – que não reconhecem a dignidade infinita de cada pessoa, “para lá de toda a circunstância e em qualquer estado ou situação se encontre” (Dicastério para a Doutrina da Fé, declaração Dignitas infinita, 1).
Isto acontece quando se perde de vista o valor de cada pessoa, tornando-se ela apenas uma despesa que, em alguns casos, aparece demasiado elevada para pagar. O pior é que, muitas vezes, acabam dominados por esta mentalidade os próprios idosos que chegam a considerar-se como um fardo, sendo os primeiros a quererem desaparecer». 

Francisco lembra também que, em muitos países, «sobretudo nos mais pobres, os idosos vivem sozinhos porque os filhos foram obrigados a emigrar. Depois, nas numerosas situações de conflito, quantos idosos ficam sozinhos, porque os homens – jovens e adultos – tiveram de ir combater, e as mulheres, sobretudo as mães com crianças pequenas, deixam o país para dar segurança aos filhos». 

Proximidade e ternura

O Santo Padre recorre ao livro de Rute para afirmar que em muitos idosos se percebe um sentimento de resignação como o que experimentou a anciã Noemi, após a morte do marido e dos filhos (cf. Rt 1, 8). «Noemi – como muitos idosos de hoje – tem receio de ficar sozinha, mas não consegue imaginar nada diferente. Como viúva, tem consciência de valer pouco aos olhos da sociedade e está convencida de que é um peso para aquelas duas jovens que, ao contrário dela, têm toda a vida pela frente. Por isso, acha melhor afastar-se; e ela mesma convida as suas noras jovens a deixá-la para ir construir o futuro delas noutros lugares (cf. Rt 1, 11-13)». A narração bíblica diz que Orpa segue o seu caminho, mas Rute decide permanecer com Noemi. Por isso, o papa assinala que Rute nos ensina a «subverter o que parece ser uma realidade imutável: viver sozinhos não pode ser a única alternativa. Não é por acaso que Rute – aquela que fica junto da idosa Noemi – foi uma antepassada do Messias (cf. Mt 1, 5), de Jesus, o Emanuel, Aquele que é «Deus connosco», Aquele que aconchega e aproxima a Deus todos os homens, de todas as condições, de todas as idades. E o papa convida-nos a seguir os passos de Rute, sem «medo de mudar os nossos caminhos e de imaginar um futuro diferente para os nossos idosos». 

Encontro entre gerações

O papa exorta a que, neste IV Dia Mundial dos Avós e Idosos, «não deixemos de mostrar a nossa ternura aos avós e aos idosos das nossas famílias, visitemos aqueles que estão desanimados e já não esperam que seja possível um futuro diferente.
À atitude egoísta que leva ao descarte e à solidão, contraponhamos o coração aberto e o rosto radioso de quem tem a coragem de dizer “não te abandonarei!” e de seguir um caminho diferente». 

Aos avós e netos de Portugal, Francisco enviou uma mensagem especial mediante um vídeo registado no Vaticano, durante a visita ad limina dos bispos portugueses. O papa ressalta que «o Dia dos Avós é um dia de encontro. É um dia para eles, mas um dia de encontro, porque os avós não gostam de estar sozinhos, gostam de estar com os seus netos».  E acrescenta: «Penso em tantos avós em Portugal. Penso nos jovens, parece que são duas partes separadas da vida: não, um jovem tem de se aproximar dos avós para os cumprimentar, para os amar e para receber sabedoria. E um avô tem de se aproximar do jovem, para não perder a sua juventude.». 

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Igreja
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Setembro 2024 - nº 749
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