O silêncio da noite estrelada foi interrompido pelo uivo lancinante dos lobos. Os pastores apressaram-se a cercar os seus rebanhos para os proteger da matilha perigosa e esfomeada. Todos se armaram com tochas e bastões. Entre eles estava Amós, um grande perito com a funda. Era capaz de atingir o alvo a mais de 100 pés de distância e, graças à sua coragem, habilidade e eficácia, conseguiu manter os rebanhos a salvo. Com uma precisão espantosa, afugentou os lobos ferozes com uma saraivada de pedras. E, quando o último predador se afastava com a cauda entre as pernas, os outros pastores aclamaram e aplaudiram Amós pelo seu grande feito.
Todos tinham grande admiração e estima por tão valente pastor. Segundo eles, amava de todo o coração o seu rebanho de cem ovelhas; conhecia cada uma delas pelo nome e ele próprio lhes dava nomes carinhosos e engraçados, de acordo com o carácter de cada animal: Nuvem de Algodão, Berlinde, Bailarina, Doçura, Sussurro da Brisa, etc. Tocando melodias doces e suaves na sua flauta, guiava as suas ovelhas para as melhores pastagens e, com a sua música, assegurava-se de que os ambientes desconhecidos não as deixavam inquietas ou dispersas. Ao meio-dia, quando o calor se tornava insuportável, conduzia-as para o bebedouro. Amós só saciava a sua própria sede quando tinha a certeza de que todas as suas ovelhas tinham bebido. Encontrava sempre abrigo à sombra de um rochedo ou numa gruta esquecida, para proteger os seus animais das intempéries.
Quando chegava a altura de tosquiar o rebanho, fazia-o com muito cuidado: devagar e sem as magoar. E se, depois, a ovelha tremia de frio, ele cobria-a com o seu manto. Vendia sempre a lã por um preço justo ou utilizava-a como moeda de troca, e fazia o mesmo com os queijos de excelente qualidade e sabor que fabricava com o leite das suas ovelhas.
Amós era também muito generoso. Partilhava sempre o pouco que tinha com os transeuntes: um figo seco, dois pistácios, três tâmaras.... Satisfazia-se com muito pouco e, quando parava para descansar, tinha apenas a terra como esteira e os braços cruzados como única almofada. Tudo o que possuía era uma túnica de lã gasta, uma capa, um par de sandálias, a funda, a flauta de cana, um odre de couro e uma tigela de barro que guardava no seu alforge, mil vezes remendado.
A vida de Amós era tranquila, fluindo como um riacho nas profundezas do vale. Mas, de repente, tudo mudou. Na escuridão da noite, resplandeceu no céu uma estrela que brilhava mais do que qualquer outra e ouviram-se vozes celestiais que anunciavam o nascimento do Messias em Belém.
Seguiu-se uma verdadeira debandada: os pastores deixaram os seus rebanhos para se dirigirem ao local indicado pela luz da estrela, a fim de verificarem por si próprios a veracidade do anúncio.
A meio da noite, Amós ficou sozinho e desnorteado entre centenas de ovelhas assustadas e dispersas. Custou-lhe sangue, suor e lágrimas reunir o seu rebanho, misturado com tantos outros abandonados à sua sorte. Construiu uma cerca com os ramos dos espinheiros e cercou as suas preciosas ovelhas, uma a uma. Mas, quando estava prestes a terminar a sua árdua tarefa, reparou que lhe faltava uma ovelhinha de cauda larga e cor manchada, chamada Beijinhos.
Sem pensar duas vezes, deixou as 99 no aprisco e saiu à procura da ovelha desgarrada, convencido de que as orelhas compridas e caídas de Beijinhos estavam presas nos espinhos de um arbusto.
Na sua busca durante a noite, Amós deparou-se com outras ovelhas perdidas que baliam com vozes fracas e trémulas, sem saberem para onde ir. Pouco a pouco, juntou-as e conduziu-as pela encosta em direcção ao local para onde os pastores tinham corrido. Por fim, chegou a uma aldeia chamada Belém e ali, ao pé de um estábulo, estavam todos reunidos, cheios de alegria, louvando a Deus e festejando o facto de o Messias tão esperado ter nascido de uma família pobre e humilde, como eles.
Vendo que Maria e José não tinham nada para cuidar e proteger a criança, o pastor mais velho e mais sábio do grupo propôs que lhes dessem as ovelhas que Amós tinha recolhido e que se juntassem às duas ou três que já estavam no estábulo e que tinham chegado primeiro. Ouvindo isto, Amós entrou na gruta escura e sombria e qual não foi a sua surpresa quando descobriu que a Beijinhos estava lá, silenciosa e tranquila, a olhar para o Menino de Belém. Exultante, carregou a sua ovelhinha às costas e começou a dançar de alegria.
Quando tudo se acalmou, os pastores ofereceram Beijinhos e as outras ovelhas perdidas à família do Messias. Maria e José, era assim que se chamavam os pais dele, prometeram guardar na memória a recordação daquele momento e contá-lo ao seu filho quando ele crescesse.
O Menino de Belém cresceu e percorreu toda a Galileia pregando o amor e a misericórdia. Elogiava frequentemente as virtudes dos bons pastores e chamava bem-aventurados aos pobres, aos rejeitados e aos perdidos. Quando Amós e os seus amigos o escutavam, pensavam no seu íntimo: «Sem dúvida alguma, os pais deste homem contaram-lhe a nossa história. Finalmente, alguém nos trouxe boas notícias; bendito o que veio em nome do Senhor!»
(Texto: Jan Musa)