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20 janeiro 2025

Elias, o profeta forte que ouve a voz de Deus

Tempo de leitura: 9 min
Servir a Deus foi a vocação do profeta Elias. Sempre com grande fidelidade e confiança em Deus, ouvia no silêncio a voz do Senhor e anunciava a Sua Palavra. A vocação e a missão de Elias desafiam a nossa própria vocação, convidando-nos a vivê-la sem reservas.
Pedro Nascimento
Leigo missionário comboniano
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Natural de Gileade, o tisbita Elias viveu no século ix a. C., nos tempos do rei Acab, soberano de Judá, o qual era casado com Jezabel e «fez o mal aos olhos do Senhor, mais do que todos os seus predecessores». Era um período de grande apostasia, em que o povo abandonou a Aliança com Javé, se desviou do culto ao Senhor e se entregou à adoração de Baal e Aserá, deuses cananeus da fertilidade. Foi, pois, nesse contexto que o profeta Elias foi chamado por Deus para convocar o povo à conversão, denunciando a idolatria, que ofendia a Deus, as injustiças sociais e anunciando o Senhor como único Deus.

As Escrituras dizem-nos que Elias era um homem de carácter forte, austero e fé convicta.
O profeta foi um grande anunciador da Palavra de Deus. Contudo, antes mesmo de a anunciar, era o próprio quem a recebia. 

 

Confiança no Senhor

Elias realizou muitos milagres em nome do Senhor, que servia e amava. A história do profeta Elias com a viúva de Sarepta é uma das minhas histórias bíblicas preferidas, de confiança total em Deus. Depois de chegar a Sarepta, como o Senhor lhe ordenara, o profeta encontra uma viúva e pede-lhe água, tendo a mesma dado de beber a Elias. Depois, o profeta pede-lhe pão, ao que a viúva lhe responde: «Pela vida do Senhor, teu Deus, não tenho pão cozido; tenho apenas um punhado de farinha na panela e um pouco de azeite na ânfora; mal tenha reunido um pouco de lenha entrarei em casa para preparar esse resto para mim e para meu filho; vamos comê-lo e depois morreremos» (cf. 1 Reis, 17, 12). O profeta, contudo, iluminado pela palavra de Deus e cheio de confiança no Senhor, diz-lhe que partilhe o pão com a certeza de que pela sua generosidade «a panela da farinha não se esgotará, nem faltará o azeite na almotolia até ao dia em que o Senhor mandar chuva sobre a face da terra». 

A viúva da Samaria confia na palavra de um estranho e faz o que lhe pede o profeta. E Deus cumpre as suas promessas. Também a nós o Senhor convida a proclamar a Sua Palavra, a denunciar as injustiças, a louvar o Seu nome e a amar os irmãos e irmãs; também, a nós Deus nos convida a ir até aos últimos e marginalizados, aos esquecidos e espezinhados, àqueles que tanto sofrem na solidão e no vazio… E quando pomos toda a nossa vida ao serviço de Deus, quando nos entregamos ao Senhor, Ele é fiel à sua Palavra. A vocação de Elias desafia a nossa própria vocação, somos interpelados a vivê-la sem reservas, sempre confiantes em Deus.

 

Fidelidade
ao projecto de Deus

Tal como cada um de nós, o profeta também teve as suas fraquezas, os seus medos e desânimos, chegando, aliás, a desejar a morte (1 Reis 19, 1-8). Todavia, enfrentou muita perseguição e oposição por parte de Jezabel, que tentou matá-lo várias vezes. Contudo, o profeta não estava sozinho – prova disso é que Deus decidiu, num acto extraordinário, tirá-lo da terra sem que ele experimentasse a morte, enviando um carro de fogo, puxado por cavalos de fogo, que separou Elias de Eliseu, o seu discípulo, e o levou ao céu num redemoinho
(cf. 2 Reis 2, 11). 

Deus, portanto, nunca abandona os que chama, nunca nos deixa sós. Necessitamos acreditar no amor de Deus e experimentá-lo nas nossas vidas, em todos os momentos da nossa vida, especialmente nos mais difíceis. E quantas vezes nos é árduo compreender e explicar este amor (nas guerras, na morte de entes queridos, nas injustiças, na doença…). Não obstante, Jesus caminha connosco, encoraja-nos, pois Ele também passou pelo sofrimento e a morte; todavia, sabemos que a morte não venceu, pois Jesus ressuscitou, mostrando-nos que a vida sempre triunfa. 

Importa recordar que os medos de Elias foram originados pela sua fé e fidelidade a Deus!
O profeta inspira-nos a ser fiéis a Deus e ao projecto que Ele tem para as nossas vidas. Isso poderá trazer-nos problemas, porém o amor de Deus é superior a tudo.

Ouvir a voz de Deus

Elias convida-nos, ainda, a estar atentos à voz de Deus. Deus revela-se ao profeta como calmo e gentil. O Senhor não estava no vento impetuoso e violento, que fendia montanhas e quebrava rochedos, nem no tremor de terra, nem no fogo, mas antes no «murmúrio de uma brisa suave» (1 Reis 19, 12).
É nesse silêncio que Elias se encontra com Deus. Por meio da oração, da leitura da Palavra de Deus, da escuta do nosso próprio coração, também nós poderemos ouvir a voz do Senhor. E, como o profeta, ser discípulos e fiéis e valentes. Sem esquecer que o maior anúncio de Deus é feito com as nossas próprias vidas, com o testemunho. Que os outros possam dizer de cada um de nós, o que a viúva disse do profeta: «Agora vejo que és um homem de Deus e que a palavra de Deus está verdadeiramente em teus lábios» (1 Reis 17, 24).

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Semear amor pelo mundo

Julio Cuesta nasceu em Espanha, há mais de 70 anos. Com um coração inquieto, como Elias, decidiu dedicar o seu trabalho e os seus esforços às zonas mais pobres do mundo. A sua vocação levou-o a La Payata, um dos recantos mais deprimidos das Filipinas. Nos arredores de Manila, o seu imenso trabalho é uma gota de esperança num mar onde mais de 250 mil pessoas vivem o seu dia-a-dia rodeadas de lixo, resíduos, gases tóxicos e doenças. 

Para Julio, ser missionário é pôr-se à disposição dos outros. «Para mim é muito fácil, porque estou rodeado de pessoas que simplesmente precisam de ajuda.»
E diz que, para explicar o que fazem, usa uma frase de Theilard de Chardin: «Semear o amor no mundo.» «Felizmente, nessa sementeira, descobrimos que não estamos sozinhos e isso é muito bom», refere.

E menciona que em La Payata mais de 250 mil pessoas que vivem em condições sub-humanas. Pessoas que não têm ninguém em quem se apoiar. A quem ninguém ajuda. «A nossa congregação da Pequena Obra da Divina Providência criou nove cozinhas em que se serve sopa, um ambulatório para doentes de tuberculose, duas clínicas médicas e um internato para crianças com deficiências físicas e mentais. Servimos muitas pessoas, mas isso é quase simbólico, tendo em conta a extrema necessidade de muitas mais pessoas», refere o missionário. E acrescenta que esses filipinos são pessoas sem futuro. «Vivem no meio do lixo e precisariam de ter um pouco mais para podermos dizer que são pobres. Olhamos para isto e pensamos: tenho de fazer alguma coisa. Especialmente no que respeita ao problema das crianças com deficiência. São directamente abandonadas, na estrada, na rua, porque as famílias nem sequer têm meios para as sustentar. Nós acolhemos cerca de cinquenta», assinala.

O missionário, com grande confiança em Deus providente, refere que não se explica como a missão consegue manter abertas todas aquelas obras. «É quase um milagre. Graças à Providência, que está sempre ao nosso lado, passaram vinte e cinco anos desde que começámos em Manila e nunca parámos de trabalhar nos nossos treze centros. Temos, todos os dias, uma quantidade infinita de trabalho pela frente: construir, acompanhar, cuidar».  

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Janeiro 2025 - nº 753
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