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17 março 2023

Abba Detomaso: 50 anos na Etiópia

Tempo de leitura: 6 min
O padre Giuseppe Detomaso tinha 30 anos quando aterrou pela primeira vez na Etiópia e ficou lá durante cinco décadas. Uma vida de serviço e entrega generosa aos mais pobres e abandonados.
P. José Vieira
Missionário Comboniano
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O padre Giuseppe Detomaso, que esteve 50 anos na Etiópia, conversa com uma senhora durante a visita a uma das povoações do país (© Diocese de Bolzano)

 

O calendário marcava 12 de Outubro de 1972, quando Abba Giuseppe Detomaso aterrou pela primeira vez na Etiópia. Tinha 30 anos. Chegou cheio de sonhos para permanecer no país durante meio século. «O meu sonho? Queria ir para uma missão, juntar-me aos missionários lá presentes; descobrir as coisas boas do povo Sidamo, estudar a sua língua e cultura e participar da sua vida», recorda.

Dias depois, foi para Sul para um primeiro contacto com as missões combonianas na província de Sidamo. No final do ano, mudou-se para Adis-Abeba, a capital, para frequentar o curso de amárico numa escola protestante.

Em Janeiro de 1974, Abba Giuseppe foi colocado em Dilla. Começou a abrir catecumenatos e escolas primárias. Em Dilla, administrou os primeiros baptismos e entregou os primeiros boletins escolares.

Em 1975, o imperador Haile Selassie foi destronado pelos militares que impuseram o Derg, um regime comunista que duraria até 1991. «O novo regime não trouxe sérios problemas às nossas missões, porque estávamos a trabalhar com os pobres, embora o perigo de expulsão fosse real», admite Abba Giuseppe.

Em Janeiro de 1976, juntou os seus parcos pertences e mudou-se para Arramo. Os missionários viviam numa barraca muito pobre sem água corrente nem electricidade, infestada de ratos e formigas, expostos à curiosidade de quem passava. Abba Giuseppe, entretanto, dedicou-se a aprender guedeo, a língua local.

A vida é feita de mudanças

Em 1986, o superior provincial pediu a Abba Giuseppe que deixasse as colinas verdes de Arramo e Galcha e se mudasse para a cidade de Hawassa, junto ao lago que lhe deu o nome, para dirigir a Escola Primária Comboni.

Foi uma obediência difícil. A escola tinha cerca de 2000 alunos desde o jardim-de-infância até à oitava classe. Era uma realidade complexa com 20 turmas, 30 professores e três turnos de ensino: manhã, tarde e noite. Contudo, o bom clima de diálogo com os professores, construído com base na confiança mútua e no esforço de ensino qualificado, granjeou uma boa reputação para a escola. Nesses dias, aos fins-de-semana, Abba Giuseppe fazia trabalho pastoral na cidade e nas capelas dos arredores.

Após sete anos a dirigir a escola primária e celebrando as bodas de prata sacerdotais, foi-lhe oferecido um ano sabático.

De volta à Etiópia, Abba Giuseppe é colocado na paróquia de Dongora. Para desenvolver o trabalho pastoral, criou uma equipa com os três melhores catequistas escolhidos pelo seu empenho e melhor educação. Foram formados para serem os seus colaboradores mais próximos e supervisores das actividades pastorais.

Na cidadezinha de Chukko, abriu uma escola de costura e um infantário. Também construiu uma bela igreja com vista à criação de uma nova paróquia.

 

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O padre Giuseppe Detomaso numa foto recente feita em Adis-Abeba, capital da Etiópia (© José Vieira/Além-Mar)

 

Depois de Dongora, foi nomeado pároco de Tullo – uma das primeiras missões entre os Sidamas na margem do lago Hawassa. Foram tempos de crise de crescimento, colaboração com os padres locais e entrega de algumas missões.

Mais tarde, o bispo decidiu dividir a paróquia, que tinha cerca de 60 capelas. Abba Giuseppe voltou a fazer as malas e foi para Arosa, a capela escolhida para ser o centro da nova missão. Contudo, a escassez de missionários levou a província a entregar Arosa ao clero local e foi transferido para Teticha, uma missão extensa nas montanhas de Sidamo, a 2700 metros acima do nível do mar, onde o comboniano português padre Ivo do Vale trabalhou bastantes anos com muito amor.

Durante a estada em Teticha, Abba Giuseppe foi convidado a ir a Fullasa – a maior paróquia do vicariato de Hawassa e no país com cerca de 40 mil católicos – para a entregar ao clero local. Ficou lá de Janeiro a Outubro de 2013.

Em 2015, chegou o tempo de dividir a missão. Os Combonianos fizeram da capela de Daye, nas terras baixas, a cerca de 50 quilómetros a sul da sede da missão, o centro da nova paróquia. Num vasto complexo, Abba Giuseppe construiu uma escola e uma casa e fez um poço para acolher a nova comunidade. A nova missão começou com 27 capelas. Os missionários também abriram um infantário, depois a escola primária e finalmente a escola média. Juntas, tinham 700 alunos.

Salvar a África com a África

A rotação interna trouxe Abba Giuseppe de Daye para Hawassa em Julho de 2020. No início deste ano, problemas de saúde obrigaram-no a ir para Adis-Abeba, onde veio a falecer no dia 13 de Janeiro passado.

O Departamento da Missão de Bolzano, na Itália – a sua diocese de origem – concluiu um documentário sobre Abba Giuseppe com estas palavras: «Tu amas o povo e o povo ama-te.» Uma frase curta que sintetiza admiravelmente o seu serviço missionário na Etiópia.

Ele próprio não precisou de muitas palavras para resumir o percurso missionário: «Tive a oportunidade de ver o início de muitas missões e depois de testemunhar a sua entrega ao clero local. O meu serviço missionário é resumido nas palavras de São Daniel Comboni “Salvar a África com a África”.»  

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