Um artigo da Scientific American reconheceu que no mês de Agosto, metade da população mundial terá experimentado os efeitos das alterações climáticas. Embora muito daquilo que se noticia e se analisa se refira ao aumento da intensidade dos fenómenos climáticos extremos, como furacões, secas e chuvas torrenciais, no fundo, será o drama humano que se desenrola por detrás dos efeitos climáticos que nos tocará no quotidiano, sobretudo em países com menos recursos. Se o resultado da nossa acção sobre o planeta deu origem ao Antropoceno, período em que começámos a mudar a face do planeta, e se o planeta reage com as alterações no clima para se adaptar aos nossos actos, teremos de fazer o mesmo.
A adaptação no ser humano ocorre a dois níveis: as ideias e o corpo. Quando, na mensagem de celebração do Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, o Papa Francisco refere a necessidade de transformar os corações, os estilos de vida e as políticas públicas, esse é um exemplo da adaptação exigida às nossas ideias para lidar com o novo cenário. Mas a adaptação que poderá ser mais exigente e que requer recursos não disponíveis a todos será a adaptação do nosso corpo.
O corpo humano é extremamente complexo e adaptável, mas tem limites. A temperatura do nosso corpo depende da capacidade de transpirarmos e de o ar evaporar a água que transpiramos, mantendo a temperatura de bolbo húmido sentida no corpo a um valor que até agora excedeu os 31 ºC. A temperatura de bolbo húmido é o valor que o ar atinge quando é arrefecido ao ponto de saturação, ou seja, quando começa a formar-se condensação ou orvalho. Quando a temperatura de bolbo húmido é alta, significa que o ar já tem muita humidade, tornando mais difícil para o corpo humano transpirar eficientemente e, assim, regular a sua temperatura. Os últimos estudos apontam que esse limite será 35 ºC e com as alterações climáticas estamos a caminhar nessa direcção.
Existem espécies de animais que sobrevivem melhor em ambientes quentes do que outras (por vezes dominantes e que deixariam de o ser). Existem vírus e bactérias adormecidos há milhares de anos no gelo dos pólos que agora começa a derreter e desconhecemos por completo o efeito que produzirão sobre a flora, a fauna e em nós. Os países com maiores recursos conseguem climatizar os espaços para dar conforto ao corpo, mas se o ar condicionado com bomba de calor (ou estratégias novas mais eficientes) não se tornar um direito humano num mundo com o clima alterado pela Humanidade, os mais pobres e desfavorecidos irão sofrer.
A Oração pelo Cuidado da Criação merece continuar para lá de Setembro por três motivos: fortalecer a nossa união com Deus; preparar-nos espiritualmente para deixarmos as nossas ideias transformar-se, de modo a adaptarmos os nossos hábitos a uma vida sóbria; e tomar consciência de que o mundo mudará e que o calor irrita mais as pessoas, pelo que no desenvolvimento da capacidade de perdoar e amar poderá estar o segredo da nossa sobrevivência.
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