Opinião
23 fevereiro 2024

Olhar

Tempo de leitura: 4 min
O olhar de Jesus exprime sempre estima, apreciação. Revela o amor que lhe vai na alma.
P. Fernando Domingues
Missionário Comboniano
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(© 123RF)

 

O olhar de Jesus deve ter sido fascinante. Dizemos que «os olhos são a janela da alma». Então Jesus, que na alma trazia todo o amor e a força de Deus, certamente olhava para as pessoas com essa mesma força e amor.  O que os evangelhos nos contam sobre o olhar de Jesus é bem diferente do que eu ouvia na catequese antiga, quando a catequista nos mostrava aquela imagem pendurada na parede na sacristia: um olho grande e sempre aberto, dentro de um triângulo, a lembrar que «Deus vê tudo e não há maneira de esconder dele as nossas más acções».

O olhar de Jesus é bem diferente, basta ver alguns exemplos: o seu olhar exprime sempre estima, apreciação. Revela o amor que lhe vai na alma. Como diz o Papa Francisco, comentando o encontro de Jesus com a mulher adúltera (Jo 8,1-11), «Jesus só olha de cima para baixo quando é para dar a mão e ajudar a pessoa a levantar-se».

Muitas vezes o evangelho diz que Jesus «levanta os olhos», como em Jericó, quando passou por baixo da árvore onde Zaqueu se tinha empoleirado para o ver passar: o olhar de Jesus eleva-se com o convite a «descer depressa». Zaqueu deixa de ser um simples espectador que olha de cima para baixo, e desce para fazer da sua casa um lugar de acolhimento e de fraternidade para Jesus e os seus amigos (Lc 19,1-10).

 Em outra ocasião, «uma certa pessoa» – não há nome: cada um de nós pode ver-se ali espelhado – chegou a correr e perguntou a Jesus o que podia fazer para «herdar a vida eterna» (Mc 10, 17-22). Jesus olhou para ele, e, desta vez, o olhar e as palavras de Jesus ofereceram um convite: «Se queres mesmo avançar para a plenitude da vida, vai, vende, dá aos pobres, vem e segue-me.» O olhar de Jesus não te deixa onde estás, aponta caminhos de maior doação e de felicidade.

Com outras duas mulheres, o olhar de Jesus vê os gestos que fazem e ressalta o seu imenso valor. Uma é a viúva pobre que coloca as duas moedinhas no tesouro do templo, em Jerusalém. Onde outros viam só miséria, Jesus levanta os olhos e vê a imensa generosidade: «Ela deu mais do que todos, deu tudo» (Lc 21,1-4). O outro gesto que atrai o olhar de Jesus é o da senhora que lhe «lava os pés com lágrimas, os enxuga com os cabelos e os unge com perfume precioso» (Lc 7,36-50). O fariseu que o tinha convidado olha e vê uma pecadora bem conhecida de todos. Jesus olha e vê a enorme capacidade de carinho de uma pessoa que experimentou o imenso perdão de Deus. Mateus (26, 13) acrescenta que o gesto dela será contado no mundo inteiro, onde quer que se anuncie o Evangelho. Na visão de Jesus, o gesto daquela mulher é o exemplo claro de como o perdão de Deus pode transformar a vida de uma pessoa.

Finalmente, o olhar de Jesus para Pedro, que acabava de o atraiçoar (Lc 22,61). É um olhar de verdade, de perdão, e de força para renovar a vida e o caminho. Leva Pedro a reconhecer a verdade da traição que acaba de fazer ao Mestre; saindo, ele chora amargamente.  Mas é um olhar que transmite também perdão e esperança: Pedro não desespera, arrepende-se, e com a força do perdão que sente no olhar de Jesus, voltará a escutar de novo o chamamento do Mestre que lhe diz «segue-me» e renova o compromisso concreto na missão que lhe tinha sido anunciada: «Farei de vós pescadores de homens.» 

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