Opinião
01 maio 2024

A arte da comunicação e a inteligência artificial

Tempo de leitura: 4 min
Os sistemas de IA podem ajudar-nos a pôr em prática uma comunicação – no seu sentido pleno de arte da comunhão –, que ponha a pessoa no centro.
Bernardino Frutuoso
Director
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(© 123RF)

 

Na era digital, caracterizada pelo rápido e complexo fluxo comunicacional, a inteligência artificial (AI) converteu-se numa ferramenta poderosa que, usando os algoritmos de aprendizagem automática, se desenvolve de uma maneira exponencial. É por isso relevante que o Papa Francisco continue a reflexão sobre a revolução da IA (em particular depois dos discursos nas assembleias plenárias da Pontifícia Academia para a Vida de 2019 e 2020) e a tenha escolhido para a mensagem do 58.º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que será celebrado no dia 12 de Maio, com o tema «Inteligência artificial e sabedoria do coração: por uma comunicação plenamente humana».

O papa começa por ressaltar que nesta época, «que corre o risco de ser rica em técnica e pobre em humanidade», a nossa reflexão sobre estas inovações tecnológicas só pode partir do coração humano. E explica o Santo Padre que «a sabedoria do coração é a virtude que nos permite combinar o todo com as partes, as decisões com as suas consequências, as grandezas com as fragilidades, o passado com o futuro, o eu com o nós».

Como acontece com todas as inovações tecnológicas (que são produzidas pelos seres humanos e, portanto, não são neutras), também o uso da IA coloca novas oportunidades e desafios à Humanidade.

Em relação às vantagens e potencialidades da IA, Francisco refere que podem «contribuir para o processo de libertação da ignorância e facilitar a troca de informações entre diferentes povos e gerações», por exemplo, «tornar acessível e compreensível um património enorme de conhecimentos, escrito em épocas passadas, ou permitir às pessoas comunicarem em línguas que lhes são desconhecidas».

Em relação aos riscos e efeitos negativos que advêm do uso desta ferramenta – ver páginas 22-24 –, o pontífice assinala que a IA pode ser um instrumento de «poluição cognitiva», ou seja, contribuir para espalhar um sistema de desinformação, nomeadamente através da disseminação das notícias falsas e do chamado deep fake – áudios, imagens e vídeos altamente manipulados –, alterando a realidade. E o desenvolvimento e uso mercantilista desta tecnologia podem também aumentar a homogeneização cultural e a desigualdade e, até, criar «novas castas baseadas no domínio informativo, gerando novas formas de exploração».

O papa apela, por isso, para a necessidade de a comunidade internacional «adoptar um tratado internacional vinculativo, que regule o desenvolvimento e o uso da IA nas suas variadas formas» – a União Europeia já estuda uma lei que garanta que os sistemas de IA sejam seguros, transparentes, rastreáveis, não discriminatórios e respeitadores do ambiente. No entanto, a regulamentação não é suficiente. Devemos cultivar o pensamento crítico e a análise reflexiva, pois como refere o papa, «a resposta às questões contemporâneas não está escrita, depende de nós». E ainda que a lógica algorítmica esteja pensada para excluir o outro e fragmentar a percepção da realidade, os sistemas de IA podem ajudar-nos a pôr em prática uma comunicação – no seu sentido pleno de arte da comunhão –, que ponha a pessoa no centro e respeite a sua dignidade indelével, construa pontes e fomente o cuidado da Casa Comum. 

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Editorial
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