Quando estava no 10.º ano em Ciências Sócioeconómicas, antes de mudar para a área de Quimicotecnia, fiz um trabalho para a disciplina de Economia com a proposta de resolver o problema do subdesenvolvimento em certos países. Recebi boa nota, mas o que não esquecerei foi a resposta da minha professora: «É uma ideia linda quereres resolver este problema, mas, para que os países pobres deixem de o ser, os países ricos também têm de deixar de ser ricos e isso será difícil acontecer.» E este fosso não existe apenas entre países, mas sobretudo entre pessoas.
A desigualdade económica que afecta o planeta Terra e alimenta a crise ambiental não existe somente entre países, mas também entre as pessoas. Li recentemente numa entrevista que fizeram ao escritor Thomas Piketty por ocasião do seu novo livro intitulado Natureza, Cultura e Desigualdades – uma perspectiva comparada e histórica (Objectiva, 2024)) que o Relatório para a Desigualdade Mundial revelou que os 10% de pessoas mais ricas deste planeta emitem 47,6% do total de emissões da população e os que estão do top 1% dos mais ricos emitem, mesmo assim, 16,8%, quase um quinto do total. Quem mais tem, mais polui, apesar de mais recursos ter para menos poluir. Demonstra-se, assim, como a crise climática não é uma questão de recursos, ou somente tecnologia, mas de vontade e comportamento, salientando a natureza antropológica do problema ambiental que enfrentamos.
De 1 de Setembro a 4 de Outubro, cristãos por todo o mundo procuraram viver o «Tempo da Criação» pensando na paz, e trabalhando em especial para: a sensibilidade de cada um ao grito da Terra, uma metáfora que advém da existência de fenómenos mais extremos que alteraram, literalmente, a face do planeta; e a sensibilidade ao grito dos pobres por serem os que mais sofrem ao verem as suas casas voar sugadas por um intenso tornado, ou inundadas por uma insólita intempérie. A leitura que faço do argumento de Piketty é a de que escutar o grito do pobre e contribuir para uma sociedade mais solidária, com menos assimetrias económicas, seria uma forma de responder ao grito da Terra alterando os nossos estilos de vida.
A solidariedade e a filantropia não são gestos exclusivos de quem tem mais recursos financeiros. A reorientação da vontade e a alteração de comportamentos fazem-se mais com a partilha de experiências concretas de vida, em vez de incentivos económicos. Podemos ser solidários pelo testemunho. Por exemplo, quando optamos por subir e descer as escadas, em vez de usar o elevador (caso não tenhamos malas de viagens ou similares), mais do que poupar energia, oferecemos um testemunho de que isso está ao alcance de todos os que têm saúde para isso. Já agora, este testemunho tenho-o em família, ao ver como a minha esposa sobe e desce até ao 6.º andar, onde fica a nossa casa.
Podemos sempre encontrar uma desculpa para desconsiderar os pequenos gestos que exigem uma vontade ou estilo de vida diferente. Não será essa desconsideração sinal de apego? O ser humano livre vive no desapego e amplia o significado de solidariedade aos pequenos, mas significativos gestos, oferecidos no testemunho quotidiano.