Quando já olhávamos para o Natal, o Papa Francisco deu-nos o que alguns gostam de chamar «a cereja em cima do bolo» de todo o ensinamento que nos tem oferecido. Uma carta sobre O Amor Humano e Divino do Coração de Jesus. Outros chamam-lhe o seu «testamento espiritual», as palavras que Francisco gostaria que sempre lembremos dele, quando já não estiver connosco.
Nesta mensagem tão especial, Francisco escolheu ir ao essencial da fé e vida cristã, Deus amou-nos com coração humano. Lá se vão – e ainda bem! – aquelas imagens de Jesus que mais parece um ser angélico do que uma verdadeira pessoa humana. Nesta carta encíclica que Francisco intitulou simplesmente Amou-nos (Dilexit nos), o papa volta a insistir que a fé cristã é muito mais do que uma série de verdades mais ou menos importantes em que é preciso acreditar; ser cristão é escolher uma forma de vida, uma maneira de amar que seja profundamente e verdadeiramente humana, porque só assim poderemos receber e transmitir a presença amorosa de Deus, que escolheu precisamente o coração humano para manifestar à Humanidade o seu amor.
Esta carta do papa apresenta-nos um duplo convite. Antes de mais, descobrir a pessoa humana, toda e qualquer pessoa, como alguém que encontra o seu centro mais autêntico no coração: se aí reina o amor, é toda a pessoa que se sente realizada, aí encontra quem é de verdade e a partir daí se torna luminosa para os outros: «Tudo está unificado no coração [...]. Se aí reina o amor, a pessoa realiza a sua identidade de forma plena e luminosa, porque cada ser humano é criado sobretudo para o amor; é feito nas suas fibras mais profundas para amar e ser amado» (Papa Francisco, Dilexit Nos, 21). Trata-se assim do desafio de olhar para o ser humano considerando que o coração é o seu centro mais íntimo, o ponto onde se cruzam e se encontram todas as dimensões do seu ser, o núcleo central do seu ser e do seu viver.
O segundo convite do Papa Francisco é olhar para a pessoa de Jesus na mesma perspectiva. Uma pessoa completamente humana, em tudo igual a nós excepto no pecado – nunca se revoltou contra Deus e assim é ainda mais autenticamente humano do que nós, pecadores. Lembramos que os evangelhos não nos dizem nada da sua vida entre os 12 e os 30 anos, precisamente porque não se distinguia dos outros seus conterrâneos. Ele não era «Deus disfarçado de homem», era um homem em quem Deus estava completamente presente sem que, por isso, ele deixasse de ser homem.
É por aí que o Papa Francisco procura ajudar-nos a descobrir e a experimentar de maneira nova o amor de Deus, um amor que é verdadeiramente humano e divino. O coração desse homem, Jesus, torna-se para nós o «lugar» onde vamos experimentar e aprender a maneira como Deus nos amou e continua a amar-nos.
Durante este ano, procurarei, cada mês, reflectir sobre um aspecto deste mistério que o Papa Francisco nos convida a contemplar.