Podemos dizer que o primeiro diálogo que encontramos na Bíblia começa com o convite que Deus faz a Adão, para que entre no seu coração com sinceridade e diga, antes de mais a si mesmo, a verdade sobre a situação em que se encontra. De facto, aquela pergunta de Deus «Adão, onde estás?» (Gen 3,9), não é Deus a querer descobrir algo que não sabia. É o Criador que, com grande delicadeza e sem pressa, ajuda o homem que criou a entrar no seu coração para encarar com sinceridade a situação em que se pôs desobedecendo a Deus.
Diz o Papa Francisco que o coração é «o lugar da sinceridade» (DN, 5), aquela profundidade em que cada pessoa é ela mesma, deixando as muitas aparências e máscaras de vário tipo com que às vezes se apresenta a si mesma e aos outros, para se encontrar consigo mesma, com quem é de verdade.
Quando, depois de comer o fruto proibido, Deus vem ao encontro de Adão e Eva, não pergunta zangado «onde está a minha maçã?» Ou, «porque não fizeram o que eu mandei?» A Deus só interessa que o casal possa reconhecer com verdade e sem angústia o «lugar» em que se encontram, pois é só de lá que poderão dar o primeiro passo para recomeçar o caminho um com o outro e com Deus. E mesmo se Adão e Eva são lentos em ver e dizer a verdade, primeiro procuram atirar a culpa para cima dos outros, mas Deus tem paciência e dá-lhes tempo para saírem do seu esconderijo.
O livro dos Provérbios citado pelo papa (Pr 4, 23) convida o crente: «Vela com todo o cuidado sobre o teu coração, porque dele jorram as fontes da vida.» E os antigos mestres cristãos, no Oriente, insistiam que o objectivo principal da nossa oração é «manter o coração vigilante», para que não se deixe enganar pelo Tentador e se mantenha sempre desperto para «perceber quando Deus passa, e receber as Suas graças».
Só se mantivermos o nosso coração sincero e atento às grandes escolhas que fizemos para orientar a nossa vida poderemos seguir o conselho de Susanna Tamaro: «Vai aonde te leva o coração» (título do livro que ela escreveu há uns anos). Se o coração permanece «vigilante e atento» às indicações que vêm do Espírito de Jesus, o nosso viver comunica paz e harmonia. Lembro com gratidão um velho missionário que encontrei em África. Com a idade, às vezes perdia a paciência, mas as pessoas que o conheciam há muitos anos sempre diziam: «Fala assim, mas a verdade é que tem um coração cheio de bondade. E continua a ser amigo de todos, como sempre foi nos muitos anos que tem vivido connosco.»
O nosso coração vai enchendo-se de bondade e de sinceridade, recebendo o Espírito de Jesus que entra em nós especialmente nos momentos de oração. Vivendo assim ao longo dos anos, poderão até vir as tempestades da vida, soprar os ventos, mas «a casa permanece firme, porque está construída sobre a rocha» (Mt 7,24-25). Um coração sincero, habitado pela bondade de Jesus, não tem medo do futuro e confia sempre em Deus, que vai conhecendo sempre melhor.