Os dois discípulos que caminhavam para Emaús devem ter ficado embasbacados quando o peregrino que se lhes tinha juntado perguntou: «Mas não era claro que o Messias tinha de sofrer isto tudo, para chegar à sua glória?»
É que a resposta era clara para todos: Não tinha, não! Segundo as Escrituras, o Messias devia triunfar e derrotar os malvados, não devia acabar naquela cruz!
De facto, a famosa personagem do profeta Isaías (cap. 42) que era conhecido como “o servo sofredor”, um homem justo que foi perseguido e que sofreu injustamente até ser morto, não tinha nada que ver com o Messias que havia de vir libertar o povo de Deus. No tempo de Jesus, todos pensavam que o Messias e o Servo fossem duas personagens muito diferentes. Um Messias derrotado seria um impostor, e não o libertador que Deus mandava ao seu povo.
Mas o peregrino misterioso entendia as coisas de outra maneira. Diz São Lucas que ele começou a lembrar-lhes todos os excertos que nas Escrituras se referiam a esse mistério. Mas no Antigo Testamento, um Messias sofredor não existe. Então, que queria dizer Jesus?
Ele já tinha deixado umas dicas, aqui e ali, durante aqueles três anos a calcorrear os caminhos da Palestina. Um dia, por exemplo, Jesus tinha parado para descansar junto ao poço de Jacob, e a uma senhora samaritana que ali viera buscar água, ele disse-lhe com palavras claras: «Esse Messias sou eu, que estou a falar contigo» (Jo 4, 26). Noutro dia, para grande confusão dos discípulos, tinha dito: «O filho do homem [esta pessoa que está aqui agora a falar convosco], deve sofrer muito... vai ser morto...» (Mc 8,31). O escândalo foi tal que Pedro começou a repreendê-lo, tentando lembrar-lhe que o caminho do Messias era a vitória, não o sofrimento.
Jesus tinha os pés na terra e sabia que o caminho do amor é exigente, e quanto maior é o amor, mais a vida se vive como um dom ao serviço dos outros. Jesus tinha no seu coração o amor do próprio Deus: «Como o meu Pai me amou, também eu vos amei» (Jo 15,9). Impossível imaginar um amor maior do que esse. Foi por isso que ele disse um dia: «Não há amor maior do que dar a vida pelos seus amigos» (Jo 15,13).
Olhamos para Jesus e começamos a compreender: Deus liberta amando, e ama dando a própria vida. Se o amor é total, a doação de si também é total. A cruz mostra-nos isso mesmo.
Os dois discípulos que caminhavam para Emaús levaram tempo a entender: com a ajuda do terceiro peregrino, foram lembrando o que já conheciam das Escrituras e foram vendo como na história de Jesus convergiam e se realizavam as duas figuras antigas do Servo Sofredor e do Messias Libertador.
O Messias, libertador enviado por Deus, aceita partilhar tudo da nossa vida, até às últimas consequências que são o sofrimento e a morte; mas o Amor que tem no coração leva-o a viver isso tudo como um «dar a vida pelos seus amigos». Com a força de Deus, até o sofrimento e a morte se tornam expressão de uma vida doada com amor. É dessa primeira vitória que vão nascer todas as outras vitórias dos amigos de Jesus, porque Ele agora está vivo e caminha connosco.
A Sua presença connosco é fortíssima, de uma maneira ou de outra, vence sempre!
É Ele que nos ensina o caminho para a vitória autêntica: a transformação da vida de muitos na direcção do amor.
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