Há palavras que podem marcar a vida de uma pessoa para sempre.
Alguém, na minha missão no Quénia, me agradeceu um dia por uma palavra que eu lhe tinha dito sete anos antes. Era uma frase do evangelho de Jesus que tinha acabado por dar luz e força à vida daquela pessoa durante anos.
Se a palavra de uma pessoa amiga pode, às vezes, ter uma força imensa, o que não poderá realizar uma Palavra que vem de Deus?
Aos dois discípulos que caminhavam para Emaús, ainda sem saberem que aquele era o dia da ressurreição, o terceiro peregrino – Jesus em pessoa – abriu-lhes a mente para entenderem as Escrituras, como nos diz São Lucas (Lc 24,27).
Aqueles textos da Sagrada Escritura eram palavras que vinham de Deus.
Aquelas profecias, salmos, histórias apontavam para um elemento fundamental no mistério daquele Deus que o povo de Israel adorava havia já tantos séculos: Deus tinha decidido falar com palavras humanas.
Em outras culturas e tradições religiosas, pensava-se que só pessoas a quem Deus dotava de capacidades extraordinárias podiam receber uma comunicação, uma palavra, vindas de Deus. E não faltavam santuários onde visionários, videntes, adivinhos mais ou menos convincentes pretendiam ser capazes de comunicar com Deus.
Na história de Israel, como a conhecemos através da Sagrada Escritura, é o próprio Deus que “desce” às nossas vidas e se manifesta de maneira que nós podemos escutar e compreender.
Foi assim quando ele falou ao grande antepassado Abraão, convidando-o a deixar a sua terra e a partir para um país novo, que o próprio Deus lhe havia de indicar; foi assim com Moisés, a quem Deus falou no monte Sinai para fazer uma aliança com aquele povo que acabava de fugir da escravidão do Egipto; foi assim com o profeta Elias, que fugia da rainha Jezabel, que o queria morto, e foi assim com os outros profetas que iam recebendo de Deus as palavras que haviam de comunicar ao Povo.
O Deus de Israel não era só um Deus Criador que tinha dado início ao Universo para depois o deixar evoluir com as suas próprias energias, era um Deus que amava as suas criaturas e gostava de estabelecer com a família humana alianças de amor e fidelidade. As Suas palavras contadas de geração em geração foram por fim recolhidas numa série de pequenos livros a que os Hebreus chamaram Sagrada Escritura. Ainda hoje há grupos de religiosos hebreus que dedicam a vida inteira ao estudo e à meditação dessas mesmas Escrituras. É que ali eles têm muito mais do que um livro com as palavras de Deus. Nesse livro eles encontram Deus presente nas suas palavras.
Naquele dia de caminho, os dois peregrinos de Emaús, e todos os outros discípulos de Jesus pelo tempo fora, entendemos finalmente esta coisa extraordinária: essa Palavra de Deus fez-se carne na pessoa concreta de Jesus Cristo. Deus, que no passado tinha falado aos antepassados de muitas maneiras, agora fala-nos na pessoa de Jesus. Ele é a Palavra de Deus encarnada numa vida humana muito concreta. Na sua pessoa, Deus continua a falar e a dialogar connosco. A mensagem de Deus que Ele nos dá – que Ele é – nós continuamos a encontrá-la no testemunho que dele deram os seus primeiros discípulos, o Novo Testamento.
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