Opinião
09 outubro 2020

Pegada suja

Tempo de leitura: 4 min
Indústrias extractivas têm «dívida ecológica» com a África.
P. José Vieira
Missionário Comboniano
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A África é um continente muito rico em minerais: ouro (89 por cento da produção mundial), tântalo (vêm da RD do Congo 80% deste metal fundamental para a indústria digital), platina (mais de 60% é produzida na África do Sul), diamantes (metade da produção global), bauxite (a Guiné detém 25% das reservas mundiais), carvão (Moçambique tem um dos maiores depósitos por explorar do mundo), cobalto, urânio, petróleo, gás natural e muito mais.

Muitas economias africanas dependem demasiado da exploração dos minérios que têm um impacto ecológico negativo como, por exemplo, nos casos do ouro, carvão e petróleo. As minas crescem à custa da deflorestação, da biodiversidade e da vida selvagem, de pastagens e terrenos agrícolas. A actividade ainda é responsável pela poluição dos solos, subsolos, água e ar que causa problemas graves de saúde, além da violência e corrupção. Noventa por cento dos africanos dependem da terra para viverem.

O Papa Francisco denunciou num curto vídeo que publicou em Setembro nas redes sociais o que chamou de «dívida ecológica» dos países e empresas do Norte, que enriquecem com a exploração dos bens naturais do Sul. Qualificou de ultrajante a prática de multinacionais que fazem no estrangeiro aquilo que lhes é proibido no próprio país.

A extracção de petróleo no delta do Níger e no Sudão do Sul são dois casos emblemáticos. A Shell, que explora o petróleo na Nigéria desde 1956, é responsável por inúmeros acidentes que contaminaram vastas áreas de solos e rios do delta, pondo em risco a subsistência dos povos locais.

No Sudão do Sul, dois relatórios encomendados pelo Governo denunciam a existência de águas e terras contaminadas com níveis muito perigosos de produtos tóxicos derivados da extracção do crude que podem estar na origem de malformações em bebés, abortos e outros problemas de saúde nos habitantes das áreas dos campos petrolíferos. As jazidas são exploradas por consórcios encabeçados por empresas chinesas com parceiros da Malásia, Índia, Egipto e Sudão do Sul. O Governo meteu os relatórios na gaveta, porque o petróleo cobre 98% das entradas do orçamento do país. Egbert Wesselink, da Pax Christi holandesa, que investigou o assunto, afirma que o país está a realizar uma das operações de extracção de petróleo mais sujas do mundo.

Entretanto, com a crise climática a mudar os motores movidos a combustíveis fósseis para eléctricos e a hidrogénio, as grandes petrolíferas procuram no plástico a alternativa para o uso do crude. O New York Times noticiou que um grupo das maiores firmas da petroquímica estava a pressionar a administração Trump para forçar o Governo queniano a importar plástico novo e em lixo. O Quénia tem uma das leis antiplásticos mais duras (usar sacos de polietileno dá prisão). Em 2019, empresas americanas exportaram mais de 450 mil toneladas de lixo plástico para 96 países para reciclagem. Muito acaba em lixeiras, rios ou no mar.

Mas também há sinais de esperança! O Zimbabué acaba de proibir a mineração em parques nacionais incluindo na reserva de Hwange, onde tinha concessionado a exploração de carvão a duas empresas chinesas. E tornou ilegal a exploração manual de ouro no leito dos rios.

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