Para mim, quando adolescente, missionários eram os «peras», nome dado aos religiosos do seminário dos Combonianos de Viseu.
Morava perto e, em férias, com frequência me esgueirava até lá. Ia jogar à bola ou às cartas, ia em busca de selos «de todo o mundo» para a minha colecção, ou apenas ouvir histórias de missionários que, com incrível entusiasmo, contavam a vida, a aventura e os perigos das missões em África. Havia ali um respiro universal que fazia sonhar e querer fazer algo semelhante! Estavam presentes os ingredientes de uma comunidade missionária. A presença evangelizava! O pior é que, quando a família descobriu que, em vez de ir trabalhar nos livros da paróquia, eu fugia para o Seminário das Missões, me proibiu de lá voltar… para não me «perder», pois o meu lugar já era o Seminário da Diocese. Os missionários eram eles! Eu não…
Lembrei esta experiência quando li a nova Instrução da Congregação do Clero intitulada Conversão Pastoral da Comunidade Paroquial ao serviço da missão evangelizadora da Igreja. Vale a pena ler e estudar, até porque todos nascemos para Cristo numa paróquia, todos temos uma imagem de comunidade onde aprendemos a dizer a vida com o olhar da fé. No novo documento, diz-se que é necessário individualizar perspectivas que permitam renovar as estruturas paroquiais «tradicionais» em chave missionária para serem protagonistas de uma «nova etapa de evangelização» (cf. EG 287). É resposta a iniciativas de reorganização do «território» das dioceses, onde a paróquia se abre a outras paróquias, constituem «unidades pastorais» e elaboraram percursos pastorais conjuntos mais centrados na evangelização que na manutenção.
Um estudo da Universidade de Pisa dizia que 80% a 85% da actividade pastoral das paróquias se destinava à conservação dos cristãos «praticantes»! Apetece dizer: «É preciso desconfinar Deus» ou «não alimentem só as mesmas ovelhas já gordas»!
Não admira que a nova Instrução já não fale só de paróquia, mas de comunidade – Povo de Deus! Vencendo a tentação do auto-referencialismo e clericalismo, haverá alegria em poder e saber «sair» para caminhar com cada irmão. Na unidade entre sacerdotes, consagrados, leigos e até homens de boa vontade não crentes ou de crença diferente, acontecerá a Nova Evangelização.
Que conversão! Imaginemos que as estruturas da pastoral, mesmo as que já deram frutos e hoje estão ultrapassadas, se tornavam missionárias: as da área social a criar projectos onde todos se sintam envolvidos; a «catequese» a traduzir o Evangelho em formas de vida inculturada, em diálogo reciprocamente enriquecedor com as outras culturas que convivem na comunidade; a liturgia, em todas as suas etapas, a convidar a recolocar Deus no centro da vida e do testemunho.
Seria bom ouvir o que contariam comunidades recentes, porventura da missão ad gentes, com estruturas simples, mas «convertidas» para evangelizar. Qual o papel dos leigos, como é a formação, o testemunho, a festa, a alegria? E nas dificuldades?
A missão ad gentes é modelo para toda a acção evangelizadora!
Afinal, até na paróquia se pode ser missionário! Até «eu» e não só «eles», os «peras»!
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