Chegar de uma longa caminhada, entrar numa casa acolhedora, refrescar os pés e as mãos com água fresca e sentar-se juntos à mesa para repartir entre todos uma pada de pão ainda quente, a sair do forno. E os companheiros com quem caminhámos o dia inteiro parecem mais verdadeiros, mais perto de nós, enquanto, entre uma bucha e outra, se vão recordando algumas passagens da jornada.
Olhamos para os três caminhantes de Emaús (Lc 24) que temos vindo a acompanhar, e vemo-los sentir o que sentimos também nós em ocasiões parecidas.
Os dois que tinham iniciado juntos aquele dia de caminho deviam sentir que as surpresas ainda não tinham acabado. De facto, o terceiro peregrino, sentando-se à mesa com eles, pegou na pada de pão – devia ser grande, para chegar para três homens – disse uma oração de bênção, partia-a e repartiu por todos. O gesto era o mesmo que Jesus tinha feito na última Ceia, na Quinta-Feira Santa, tinha sido um momento extraordinário que os discípulos tinham vivido com Jesus, com Maria a mãe, e certamente com outros discípulos e discípulas. E nesse momento, quando Jesus partia o pão, diz-nos São Lucas (24,31), que «os olhos deles foram abertos e reconheceram-no». O sentido é que foi Deus quem lhes «abriu os olhos» para eles poderem finalmente reconhecer Jesus. E logo, ele «tornou-se invisível para eles». São Lucas não diz que Jesus se ausentou. O que o evangelista quer que entendamos é que Jesus continuou presente, de outra maneira. Eles já não precisavam que ele se mostrasse visivelmente aos seus olhos porque agora sabiam que ele estava presente «ao partir do pão».
Os dois peregrinos de Emaús aprenderam bem a lição: daquele dia em diante, os vários grupos de discípulos de Jesus começaram a fazer o mesmo quando se reuniam nas suas casas, no primeiro dia da semana (o mesmo dia em que Jesus tinha ressuscitado e tinha caminhado com aqueles dois para Emaús). Encontravam-se, escutavam as memórias dos apóstolos – da boca deles mesmos enquanto viviam, e dos evangelhos escritos e das suas cartas, mais tarde –, depois quem presidia pegava numa pada de pão, grande que chegasse para todos os presentes, dizia uma oração de bênção, repartia-a e partilhava com todos; e faziam o mesmo com uma taça de sumo de uva fermentado, misturado com água para todos poderem beber. Àqueles primeiros dois à mesa de Emaús, Deus tinha «aberto os olhos» para reconhecerem Jesus. Agora, e ao longo dos séculos até ao nosso tempo, Deus continua a abrir os olhos da fé a quantos vimos «sentar-nos à mesa» no primeiro dia da semana (domingo). E é por isso que ainda hoje, quando vemos o gesto de «partir o pão», a assembleia reunida abre os olhos da fé e numa só voz, fala com Jesus dizendo-lhe: «Cordeiro de Deus, que tiras o pecado do mundo, tem piedade de nós...» Porque o reconhecemos presente à nossa mesa, podemos falar com ele, rezar.
A nossa Eucaristia nasceu em Jerusalém e em Emaús. Celebrá-la em Novembro lembra-nos que a nossa caminhada de cada semana até à «mesa do pão repartido» só chegará à meta quando nos sentarmos finalmente com Jesus, à mesa do grande banquete no Reino dos Céus.
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