Opinião
21 abril 2021

Vozes proféticas

Tempo de leitura: 4 min
Bispos africanos estão a dar voz a posições arrojadas.
P. José Vieira
Missionário Comboniano
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O episcopado africano pode ser considerado conservador na teologia, pastoral e liturgia. Contudo, tanto as conferências episcopais como bispos em particular estão a dar voz a posições arrojadas por todo o continente.

A SECAM – o Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar – apresentou no fim de Janeiro o chamado «Documento de Campala», uma exortação pastoral de uma centena de páginas que nasceu das celebrações dos 50 anos da instituição. Pretende resolver as «dicotomias entre fé e política, Reino de Deus e transformação da Terra, salvação das almas e vidas terrenais, contemplação e acção». Alerta ainda para os perigos das espiritualidades de salvação e de prosperidade baseadas no sucesso e em soluções milagrosas.

As eleições são ocasiões em que muitas conferências episcopais fazem sentir as suas vozes e os seus reparos. Os bispos do Uganda, por exemplo, antes das presidenciais de Janeiro passado, recordaram que o «não roubarás» também se aplica aos votos e alertaram para a comercialização do acto eleitoral através de campanhas cada vez mais dispendiosas.

Os bispos da República Centro-Africana, no rescaldo das eleições de Dezembro, que deixaram o país a ferro e fogo, pediram diálogo sincero, franco, fraterno e construtivo para resolver a grave crise de violência que afecta o país. Denunciaram o sistema de uma minoria que beneficia das riquezas do país por causa da filiação partidária e afinidades tribais, e as conspirações externas com cumplicidades locais, que deixam o país à mercê de predadores e mercenários bem armados.

A Conferência Episcopal do Congo-Brazzaville também se pronunciou sobre a eleição presidencial marcada para 21 de Março: «Temos reservas sérias que uma eleição presidencial pacífica, participada, transparente, livre e credível possa acontecer nas condições actuais», escreveram.

Os bispos do Benim pediram diálogo forte e aberto entre os partidos e as instituições envolvidos nas presidenciais de Abril.

A pandemia de covid-19 – que a 15 de Março tinha matado no continente 108 064 pessoas (África CDC) e infectado 4 041 835 – também levou os bispos a tomar posições fortes de liderança. Por exemplo, a Conferência Episcopal da Tanzânia alertou para os perigos da segunda vaga da pandemia, porque «o nosso país não é uma ilha». Pede aos Tanzanianos que voltem a usar máscaras e a lavar as mãos com água e sabão, práticas que haviam abandonado. Os bispos do Senegal também expressaram a sua preocupação com as novas estirpes mais mortíferas da segunda vaga da doença.

Há ainda as vozes proféticas do bispo Dom Luiz Fernando Lisboa, de Pemba (Moçambique), que colocou o drama de Cabo Delgado na agenda internacional e que entretanto tomou conta de uma diocese no Brasil natal, de Dom Agapitus Nfon, de Kumba (Camarões), que tenta mediar a crise anglófona, que já fez três mil mortos desde 2016, ou Dom Stephen Dami Mamza (na foto), bispo de Yola, na Nigéria, que construiu um bairro para alojar 86 famílias deslocadas pela violência do Boko Haram, com escola e mesquita incluídas.  

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