Apesar de ter um nome difícil de pronunciar, Chimamanda Ngozi Adichie é um caso sério de sucesso na literatura anglófona africana contemporânea e uma conferencista notável e premiada, de pensamento original. Nasceu na Nigéria há 44 anos e foi estudar para os Estados Unidos da América com 19. Define-se como contadora de histórias. Tem três novelas publicadas (A Cor de Hibisco, Meio Sol Amarelo e Americanah), uma colecção de pequenos contos (A Coisa à Volta do Teu Pescoço) e três obras de não-ficção (Todos Devemos Ser Feministas, Querida Ijeawele – Como Educar para o Feminismo e Notas sobre o luto – uma reflexão sobre a perda do pai). A obra está traduzida em 31 línguas, português incluído.
Em Junho, deu uma entrevista em directo de Lagos, na Nigéria, ao programa Roda Vida da TV Cultura do Brasil. À pergunta sobre o papel da religião e como é que as religiões de matriz africana podem ajudar a construir um novo modelo de relações humanas, dá uma resposta interessante: «O mais importante a dizer, antes de mais nada, é que por todo o continente africano o cristianismo pentecostal é simplesmente avassalador e há coisas boas nele e outras que não são boas. As coisas boas acho que é o que as pessoas precisam. Na Nigéria, onde não têm acesso a políticas de saúde mental, de alguma forma a religião faz esse papel. Mas, ao mesmo tempo, há um certo tipo de cristianismo pentecostal que prega a prosperidade, e associa riquezas com bênçãos. Essa ideia de que se rezar Deus fá-lo rico ou lhe dá dinheiro, esse tipo de coisa é que acho perturbador.»
Sobre a religião tradicional africana, Chimamanda, que é católica, explica: «Uma das coisas que o Cristianismo fez ao chegar com o colonialismo foi ensinar a muitos africanos que a religião que estava lá, dos pais e dos antepassados, era má de alguma forma. Hoje em dia encontro muita gente a falar sobre as religiões tradicionais como se fossem, de certo modo, “demoníacas”, “diabólicas”, “más”. […] Realmente não existe muito uma consciência sobre as religiões tradicionais africanas entre os jovens nigerianos.»
E continua: «Porque o Cristianismo é tão padrão – no Sul da Nigéria, porque no Norte da Nigéria é o islão – aquilo em que estou cada vez mais interessada é em como africanizar o Cristianismo. Fui a um funeral na minha terra natal. Recordo olhar para a Santíssima Virgem Maria e pensar: “É tão estranho! Tem a estátua de uma mulher branca. Para começar é historicamente incorrecto, porque ela não podia ter sido loira e de olhos azuis.” Depois ficava a pensar: “Porque nunca pensamos em tentar africanizar estas imagens que reflectem a nossa fé? Certamente que é possível africanizar o Cristianismo e apropriarmo-nos um pouco mais dele”.»
Ao processo de africanização da liturgia, teologia e arte já em curso em muitos países chama-se inculturação. Porque «uma fé que não se incultura não é autêntica», como o Papa Francisco escreveu na mensagem ao Congresso sobre Vida Religiosa na América Latina e Caraíbas, em Agosto.
|