Começamos a rubrica destinada a favorecer um aprofundamento das palavras-chave do vocabulário do Papa Francisco, relevantes para a missão, com Encontro. Ele recorda-nos que na origem da fé não está uma ideia ou um ideal ético, mas sim um «encontro» com uma pessoa concreta, Cristo; e que a identidade do caminho cristão se vive no encontro com Deus e os outros.
Já na narrativa bíblica da criação, a terra é idealizada como lugar do encontro da pessoa com as outras criaturas e com a Natureza, num dinamismo de fruição e de liberdade, sob o olhar de Deus que «passeava no jardim ao cair da tarde». Com a experiência traumática da liberdade e da falta de confiança em Deus e no outro, introduz-se nas relações humanas o medo e a distância, que tornam o encontro problemático. Deus continua a descer e a passear no jardim, à procura de um encontro, mas «o homem e a mulher escondem-se do Senhor no meio das árvores do jardim» e culpam-se um ao outro pelo desconforto do encontro (Génesis 3, 8-13).
Na raiz do caminho de fé está a ideia do encontro entre Deus e aqueles que Deus escolhe para viver em aliança. A tradição litúrgica em Israel constrói-se, igualmente; sob o paradigma do encontro. O primeiro templo que o povo da aliança conhece é a tenda. A palavra «tenda», em hebraico, tem a mesma raiz que a palavra «encontro». A tenda guarda a arca da aliança, com as tábuas da Lei, e é chamada lugar do encontro.
Jesus insere o seu movimento neste dinamismo do encontro: com o seu ensinamento itinerante procura um encontro com as pessoas, nos seus lugares habituais de encontro (na sinagoga, nas praças, nos caminhos, nas margens do lago). Ele faz o anúncio da soberania de Deus, num modo e com palavras que favorecem o encontro e expõe-se à surpresa que cada encontro comporta, com a possibilidade de abertura, mas também de recusa. Os evangelhos dão-nos conta destes encontros de Cristo com as pessoas. Primeiro, na intimidade da casa, na relação pessoal, em que o mistério da pessoa se revela e a identidade se constrói. Depois, no tumulto da vida e do trabalho. Por fim, no meio da alegria de viver, à volta da mesa, nas festas e nos momentos decisivos da vida das pessoas e da comunidade. No centro deste movimento estão os excluídos (pobres e doentes), de uma sociedade que, apesar de ser construída sobre a aliança com Deus e com os outros, consentia o descarte de pessoas. Jesus procura o encontro e oferece uma resposta, na sua palavra e na sua acção.
Francisco convida-nos a reconduzirmos a vida cristã a este paradigma do encontro, e a não nos deixarmos roubar a alegria do encontro com Cristo e os irmãos (Evangelii Gaudium 1 e 92). E a iluminarmos a missão dos cristãos no mundo de hoje com o sonho da fraternidade humana: na Fratelli Tutti (216-221) ele sugere um modelo de missão centrado na fraternidade; e propõe também, às demais religiões e às pessoas de boa vontade, a cultura do encontro que torne possível uma política melhor.
Nós, nesta questão como noutras, deixamos o papa a falar sozinho. Ele fala ao coração das pessoas, com palavras que elas entendem e com gestos que falam da sua procura de encontros com todos, a começar pelos descartados da nossa sociedade tão opulenta e fechada em si.
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