Opinião
17 fevereiro 2022

Peregrinos da Esperança

Tempo de leitura: 6 min
«Devemos manter acesa a chama da esperança que nos foi dada e fazer todo o possível para que cada um recupere a força e a certeza de olhar para o futuro com espírito aberto, coração confiante e mente clarividente.»
Miguel Oliveira Panão
Professor universitário
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Todos ansiamos (no bom sentido) renascer das cinzas da pandemia. Quando no horizonte emerge uma esperança, e dessa uma orientação e sentido, sabemos para onde devemos caminhar e isso ajuda a dar passos na nossa vida. O Papa Francisco impulsionou o Ano Jubilar de 2025 como um farol no mar conturbado e o mote que escolheu para esse evento foi ”Peregrinos da Esperança”.

Se pensarmos bem, o Ano Jubilar de 2025 marca o primeiro quarto do século XXI. Todo o Ano Jubilar possui um olhar particular sobre a experiência da misericórdia de Deus, da força interior do Seu amor e ternura pela humanidade. A inesperada etapa de superação de uma pandemia abalou muitas das nossas seguranças, mas Deus convida-nos sempre a renovar a nossa confiança na Sua misericórdia. A resposta à solidão que muitos experimentaram e que alterou o nosso modo de ser e estar uns com os outros suscita, gradualmente, o desejo de redescobrir a proximidade, tal como se antecipa com o Ano Jubilar.

Durante mais de dois anos vivemos fechados em quatro paredes apesar da internet ter aberto a mente ao mundo. Mas essa abertura mudou a nossa sensibilidade e desejo de estarmos juntos. Por um lado ouvimos as pessoas manifestarem o seu cansaço pela actividades online, mas, por outro lado, continuamos a promovê-las e adiamos os momentos em que já poderíamos beneficiar da presença uns dos outros. Nos últimos tempos têm vindo a público a dor de muitos que se diziam cristãos, mas foram incapazes de ver Jesus nos mais pequenos, abusando deles. Ou vieram à luz outros abusos de índole psicológica, mais difíceis de identificar, mas que completam um lado escuro que exige um mea culpa de todos nós que formamos um só corpo. É deste sofrimento que nascem os sinais de renascer para uma nova esperança.

Na carta ao Arcebispo Rino Fisichella, o Papa diz que — «Devemos manter acesa a chama da esperança que nos foi dada e fazer todo o possível para que cada um recupere a força e a certeza de olhar para o futuro com espírito aberto, coração confiante e mente clarividente. O próximo Jubileu poderá favorecer imenso a recomposição dum clima de esperança e confiança, como sinal dum renovado renascimento do qual todos sentimos a urgência. Por isso escolhi o lema Peregrinos de esperança — Com esta expressão, o Papa assinala a necessidade de recuperar o sentido de fraternidade universal onde todos nos reconhecemos como irmãos, incluindo o mundo natural.

Cada vez mais jovens e adultos são sensíveis ao cuidado com o nosso relacionamento com a criação. Aliás, muitos reclamam a necessidade de passar da palavra à acção e foi por essa razão que no final de 2021 o Papa lançou a Plataforma de Acção Laudato Si’ (https://plataformadeacaolaudatosi.org). São poucos ainda os que conhecem esta plataforma ou se inscreveram para iniciar um percurso de sete anos que dê vida a sete propósitos inspirados na Laudato Si’:

– responder ao grito da Terra;

– responder ao grito dos pobres;

– optar por uma economia ecológica;

– adoptar estilos de vida mais sustentáveis;

– apostar numa educação ecológica;

– aprofundar uma espiritualidade ecológica;

– e trabalhar a resiliência das nossas comunidades, entusiasmando-as a serem motores e protagonistas da mudança social.

O ano jubilar parece estar ainda longe, e longe está, também, a intenção do Papa em fazer deste marco mais uma coisa a fazer, para além do Sínodo dos Bispos dedicado à Sinodalidade, entre outras coisas. Por isso, convida a fazer no ano de 2024 uma «grande sinfonia de oração». Uma oração com expressões de louvor, de sermos «um só coração e uma só alma» (Act 4, 32), de partilha, de oferta da nossa vida a Deus, e de contemplação no meio da acção. Diz o Papa – «Em suma, um ano intenso de oração, em que os corações se abram para receber a abundância da graça, fazendo do “Pai Nosso” – a oração que Jesus nos ensinou – o programa de vida de todos os seus discípulos.»

Com a vida à la minute que muitos de nós vive, pensar nesta preparação não parece ser uma prioridade, mas se reconhecermos que estamos sempre a caminho, os mais experientes em caminhadas sabem como a preparação é essencial para se chegar ao fim. Existem alpinistas que demoram cinco ou seis anos a preparar-se para uma escalada inédita. E quando a fazem são admirados pelo feito único em tão pouco tempo. Poucos são o que pensam no tempo de preparação que antecedeu o feito ou dão-lhe o devido valor. A gratificação instantânea não tem ajudado a cultivar a paciência da preparação, mas qualquer Ano Jubilar nos ensina que vamos sempre a tempo de recomeçar.

 

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