Alguns amigos da Coreia do Sul, que encontrei em Roma durante os meus anos de serviço nessa cidade, gostavam muito de festejar o dia 25 de Março. Nós chamamos-lhe Festa da Anunciação – quando o Anjo de Deus anuncia a Maria que ela será a mãe do Salvador, Jesus. Eles festejam nesse dia o início da vida de Jesus neste mundo, como eles mesmos festejam o próprio dia de anos não no dia em que foram dados à luz, mas sim no dia em que começaram a existir no seio materno, nove meses antes. Foi esse, na verdade, o grande início do mistério que chamamos Encarnação do Filho de Deus. De facto, nós acreditamos que Jesus é Deus desde o primeiro instante da sua vida no seio de Maria.
Nos primeiros séculos da Igreja, um grupo bem grande de cristãos acreditavam que Maria tinha dado à luz um simples ser humano como nós e que o Filho de Deus tinha descido do Céu sobre a pessoa de Jesus só no dia do seu baptismo no rio Jordão. O segundo concílio de Constantinopla (ano 553) teve de enfrentar essa questão e esclareceu que a pessoa de Jesus era o Filho de Deus desde o primeiro instante da sua vida no seio de Maria, desde o dia da Anunciação!
Isso pode parecer uma questão só teórica e de pouca importância, mas, na realidade, quer dizer que a vida humana concreta de Jesus, não só o seu corpo material, mas também as suas emoções, o seu crescer e tornar-se adulto, o seu aprender a falar, caminhar, rezar, as amizades que viveu e o seu esforço de aprender a profissão do pai José – é tudo isso que entendemos quando falamos da sua “carne” e dizemos que nele, a Palavra eterna de Deus «se fez carne» (Jo 1,14). Sendo assim, podíamos bem dizer que foi no dia da Anunciação que Deus «começou a fazer-se carne», e esse caminho de encarnação de Deus só ficou completo na noite de Páscoa, quando ele ressuscitou.
Os primeiros teólogos da Igreja (os padres da Igreja) maravilhavam-se ao pensar que a cada dia que o jovem Jesus ia vivendo em Nazaré, conforme ele ia crescendo e vivendo novas experiências, era Deus a entrar em novas realidades humanas e novas partes da nossa vida concreta se tornavam presença real de Deus no nosso mundo.
É nessa mesma linha que alguns cristãos gostam de pensar que a Encarnação de Deus em Jesus é o ponto mais alto da História da Natureza, desde que o mundo começou a existir. O Universo, nascido de um gesto de amor de Deus Criador, esta Natureza em que vivemos, foi avançando até poder ser assumida pelo próprio Deus como sua presença pessoal no mundo, na existência concreta daquela pessoa que aprendemos a conhecer com o nome de Jesus.
E a História do mundo, de Jesus para diante? Há quem goste de pensar que esta História – o tempo que nós vivemos – é para irmos realizando, pouco a pouco, mesmo se de maneira limitada, o que foi realizado de maneira total em Jesus: cada pessoa e cada criatura ser uma presença de Deus.
Acreditar no mistério da Encarnação leva-nos a uma visão bem bonita do nosso mundo e confia-nos a tarefa de fazermos da vida de cada um de nós e da Natureza em que vivemos, um sinal da presença de Deus.
|