Opinião
01 abril 2022

Calar as armas, construir a paz

Tempo de leitura: 4 min
Os discípulos de Jesus estamos chamados a não deixar morrer a esperança e a comprometermo-nos activamente na construção da paz.
Bernardino Frutuoso
Director
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Na Ucrânia «enfrentamos a peste da guerra como nos tempos bíblicos», disse, utilizando a referência ao texto sagrado, o alto-representante da União Europeia, Josep Borrell. Efectivamente, com a invasão da Rússia à Ucrânia, desencadeou-se no coração da Europa um conflito devastador – que se soma a outros menos mediatizados, da Síria à Etiópia, passando pelo Sudão do Sul e o Iémen – e que tem implicações globais ainda imprevisíveis.

Nesta era digital hiperconectada, a mediatização da guerra faz-se continuamente e há vídeos, imagens e notícias sempre novos, que se podem ver nos telemóveis ou na televisão e que nos aproximam dos confrontos no terreno e do quotidiano angustiante do conflito. Essa cobertura jornalística constante permite-nos testemunhar a destruição causada pelos bombardeamentos, o drama da fuga apressada e dolorosa das pessoas obrigadas a fugir das suas casas sem nada, os apelos pessoais e comovedores do presidente Zelenskii, as acções e a narrativa esperançosa da resistência deste povo crucificado pela violência sem sentido.

A narrativa mediática permite-nos, igualmente, conhecer as vítimas do conflito e o drama dos deslocados e refugiados, o maior êxodo que se vive na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. De acordo com os dados das Nações Unidas, já há 6,5 milhões de deslocados internos e mais de 3,5 milhões de ucranianos foram obrigados a abandonar a sua pátria devido à guerra.

Ao mesmo tempo, observamos como a sociedade civil está unida e milhões de vozes se elevam para clamar pela paz. Multiplicam-se as acções de solidariedade – como as que a Cáritas realiza e de que falamos nas páginas 46 a 49 –, mostrando que a força do amor é mais forte e tem mais alcance que qualquer míssil de última geração. Ante uma ameaça sem precedentes, o mundo está a responder com uma onda de gestos existencialmente significativos, perceptíveis nas doações generosas, no trabalho de milhares de voluntários que se deslocam para as fronteiras para ir em socorro dos que fogem, nas pessoas que abrem as suas casas às famílias exiladas ou nas diferentes Igrejas que rezam e se mobilizam para auxiliar as vítimas da guerra.

Os discípulos de Jesus, que enraizamos a nossa vida no Evangelho, acreditamos na «omnipotência da oração», como dizia São Daniel Comboni, e intercedemos ante Deus por este povo que sofre e pelo silenciamento das armas na Ucrânia. Estamos chamados a não deixar morrer a esperança e a comprometermo-nos activamente na construção da paz – seguindo o exemplo do papa, que se deslocou à embaixada russa junto da Santa Sé para exigir o fim da violência, numa reacção sem precedentes na história do Vaticano. Como propõe Francisco na encíclica Fratelli Tutti, somos desafiados a colaborar activamente na edificação da fraternidade e da amizade social, criando pontes solidárias, apoiando as vítimas, denunciando a insensatez da guerra, condenando a corrida ao rearmamento. Contribuímos, assim, para o restabelecimento da paz, com a certeza de que a paz é um dos dons e das promessas do Ressuscitado, cuja Páscoa, a vitória da vida sobre a morte, celebramos este mês. 

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Editorial
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