Opinião
01 maio 2022

A arte de saber escutar

Tempo de leitura: 4 min
O Papa Francisco recorre à metáfora do coração e propõe na mensagem para o Dia Mundial das Comunicações, o desafio de «escutar com o ouvido do coração».
Bernardino Frutuoso
Director
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Uma das maiores dificuldades que nós, missionários, enfrentamos, quando estamos em terras de missão, é não sermos capazes de comunicar como gostaríamos por causa do desconhecimento do idioma. Em muitos dos lugares onde trabalhamos, a língua é muito difícil de aprender e o missionário tem de recorrer a intérpretes ou tradutores. No entanto, além de saber falar, outro aspecto fundamental no processo de comunicação humana é a escuta, como refere o Papa Francisco na mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se assinala no domingo antes do Pentecostes, este ano no dia 29 de Maio. No texto, o papa sublinha que «a escuta é o primeiro e indispensável ingrediente do diálogo», pois só se «sairmos do monólogo é que se pode chegar àquela concordância de vozes que é garantia de uma verdadeira comunicação».

Contudo, como podemos escutar quando não conhecemos a língua? A experiência na missão fez-me compreender que saber escutar é um processo de crescimento e que as diferenças ou as dificuldades linguísticas não impedem a verdadeira comunicação. Existem outras formas de se expressar e de chegar ao coração das pessoas. Os gestos, o sorriso, o olhar transparente, a amabilidade e a delicadeza e outros sentimentos que nascem do coração podem, inclusive, ser uma linguagem mais eloquente do que as palavras que pronunciamos. Nessa linha, o papa recorrendo à metáfora do coração, com profundas raízes e significações bíblicas, propõe na sua mensagem o desafio de «escutar com o ouvido do coração».

Na era da conectividade global, centrada na Internet, nas redes sociais e smartphones, muitos dos nossos processos comunicativos são feitos nos ecossistemas digitais. Esta comunicação imediata e ubíqua, integrada na vida quotidiana, cria pontes e aproxima-nos das pessoas em qualquer parte do planeta, gerando cadeias de amizade e solidariedade (como agora no caso da Ucrânia), tolerância e respeito. No entanto, esta cultura mediática em rede também tem limites e perigos a que devemos prestar atenção. Por exemplo, os media digitais podem ser utilizados para difundir notícias falsas ou preconceitos (nesse sentido, o papa menciona a necessidade de escutar as histórias dos migrantes para evitar visões superficiais e sem fundamento), ou fazer-nos cair na tentação de procurar «saber e espiar, instrumentalizando os outros para os nossos interesses».

Na Igreja, assinala o pontífice, também «há grande necessidade de escutar e de nos escutarmos», pois «na acção pastoral, a obra mais importante é o “apostolado do ouvido”». E Francisco lembra o caminho sinodal que estamos a realizar como Povo de Deus, convidando-nos a rezar para que «seja uma grande ocasião de escuta recíproca». E frisa que, «com efeito, a comunhão não é o resultado de estratégias e programas, mas edifica-se na escuta mútua entre irmãos e irmãs. Como num coro, a unidade requer, não a uniformidade, a monotonia, mas a pluralidade e variedade das vozes, a polifonia». A comunhão eclesial é sinfónica, e cada discípulo de Jesus, escutando a voz de Deus e os sinais dos tempos, «é capaz de cantar com a própria voz, acolhendo como dom as dos outros, para manifestar a harmonia do conjunto que o Espírito Santo compõe».   

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Editorial
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