Se acordares pela manhã e ouvires o canto das aves, podes agradecer a Rachel Carson, que há sessenta anos alertou que, se nada fizéssemos, poderíamos viver Primaveras silenciosas. Em Setembro deste ano, faz sessenta anos da publicação de Primavera Silenciosa da bióloga marinha Rachel Carson, focado no efeito que os pesticidas estavam a fazer ao meio ambiente e aos seres humanos. Esta obra deu um grande impulso ao movimento ecológico, mas não é certo o destino das aves. O seu canto ainda não está totalmente a salvo.
Nos últimos cinquenta anos, os EUA perderam mais de três mil milhões de aves. Um estudo publicado na prestigiada revista Science em Setembro de 2019 diz que a intensificação da agricultura e da urbanização terá levado a esta redução entre muitos outros factores cuja ligação é complexa, uma vez que tudo está ligado com tudo.
Em Julho de 2021, Barbara Cohn, epidemiologista, quando confrontada com a questão dos amigos sobre a razão de continuar a estudar o DDT [sigla de dicloro-difenil-tricloroetano, um potente insecticida] quando este havia sido erradicado, responde que os seus efeitos se fazem ainda sentir, por exemplo, no cancro da mama, hipertensão e obesidade de muitas mulheres grávidas que na altura consumiram o químico. Neste sentido, o alerta de Rachel Carson não afectou somente a sensibilidade humana à sobrevivência da biodiversidade, mas reflecte-se ainda hoje na relação entre o modo como a nossa acção nociva para com o meio ambiente afecta a saúde humana. Algo que não é de todo linear.
Em 2006, a Organização Mundial de Saúde recomendou o uso de DDT para combater a malária em África motivado pela protecção da saúde humana contra esta doença que chegou a matar 880 mil pessoas por ano, sendo a maior parte crianças. Mas em Maio de 2009, um painel de cientistas recomendou a redução do uso de DDT devido aos efeitos nocivos de longa duração que tem sobre a saúde humana, de tal modo que não podemos combater um problema criando outro que pode durar gerações. Se pensarmos bem, estas delicadas nuances fazem sempre parte de um processo sério de discernimento, fazendo lembrar a questão da sinodalidade.
Um dos aspectos a discutir no processo sinodal que decorre ainda (e espero que decorra por um longo tempo) é o discernimento dos sinais dos tempos. Da leitura dos estudos científicos que Rachel Carson realizou, não é evidente que pudessem dar origem ao movimento ecológico. Foi a sua arte de comunicar a ciência em termos simples que levou políticos e pessoas comuns a compreender a necessidade de repensar os estilos de vida.
Carson queria salvar o canto das aves para evitar Primaveras silenciosas. S. Francisco entoou o cântico das criaturas para nos ajudar a descobrir como todos fazemos parte da família da criação se nos sensibilizarmos para a presença de Deus através da contemplação dos relacionamentos presentes na Natureza. Hoje, com a sinodalidade que nos educa a ler os sinais dos tempos, poderemos unir as dinâmicas do conhecimento e da fé e seremos protagonistas de um contemplável mundo novo.
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