Em Junho, na Nigéria, 22 católicos foram assassinados quando estavam a celebrar a missa da solenidade de Pentecostes. Suspeita-se que o Estado Islâmico da Província da África Ocidental (ISWAP, na sigla em inglês) seja o perpetrador da horrorosa chacina. De acordo com os dados da associação Portas Abertas, foi esse grupo extremista o responsável por grande parte das 4659 mortes de cristãos que ocorreram entre 1 de Outubro de 2020 e 30 de Setembro de 2021, na Nigéria, o país onde os discípulos de Jesus têm vivido maior violência no mundo. Atentados semelhantes ocorrem com frequência também noutros países, nomeadamente no Burquina Faso, no Níger e no Mali.
Esta violência por motivos religiosos ou culturais, que atenta contra a vida humana em nome de Deus, é, sem dúvida, uma das acções mais execráveis do nosso tempo e mostra a persistência da instrumentalização da religião no mundo moderno. A este respeito, afirmam o Papa Francisco e o grão-imã Ahmad Al-Tayyeb no Documento sobre a fraternidade humana em prol da paz e da convivência comum: «As religiões nunca incitam à guerra e não solicitam sentimentos de ódio, hostilidade, extremismo nem convidam à violência ou ao derramamento de sangue. Estas calamidades são fruto de desvio dos ensinamentos religiosos, do uso político das religiões e também das interpretações de grupos de homens de religião.»
Se em outros períodos da História as religiões foram origem e motivo para guerras e violência, agora é o momento para que, decididamente, sejam instrumentos de paz e fraternidade e, no diálogo e respeito mútuo, encontrem soluções para as dores e os dramas que afligem a Humanidade, contribuindo para o bem comum e a construção da cultura da não-violência, da tolerância, da solidariedade e da sã convivência. O filósofo e teólogo Hans Küng (1928-2021), que nos deixou um grande legado, foi uma figura decisiva para o diálogo inter-religioso e um dos grandes defensores do Parlamento Mundial das Religiões, uma iniciativa que surgiu em 1893 e possibilitou processos de aproximação e diálogo entre as religiões. O teólogo suíço, que procurou construir pontes e encontrar «os denominadores comuns a todas as culturas e religiões», propôs um projecto de ética global, baseado no princípio de que «não haverá paz entre as nações, se não existir paz entre as religiões; não haverá paz entre as religiões, se não existir diálogo entre as religiões; não haverá diálogo entre as religiões, se não existirem padrões éticos globais».
O Papa Francisco promulgou, no passado dia 19 de Março, a constituição apostólica Praedicate Evangelium, que reforma a cúria romana, situando esse serviço eclesial no contexto da evangelização e expressando o seu desejo de uma Igreja missionária, sempre em saída, mais colegial e sinodal. Entre as mudanças destaca-se a criação do Dicastério para o Diálogo Inter-Religioso, facto que sublinha bem a relevância que tem para a Igreja a promoção do diálogo, do conhecimento mútuo e da colaboração com as pessoas que professam credos religiosos não cristãos.
Neste mundo plural em que vivemos, o diálogo inter-religioso é uma postura existencial que deve animar todos os cristãos e nos permite sonhar com um presente e um futuro mais pacíficos e fraternos.
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