O mundo vive imerso na ressaca da pandemia e na dor da guerra na Ucrânia, mas nestes meses de descanso não pudemos eliminar a possibilidade de redescobrir quanto mais de mundo existe à nossa volta e que precisa do nosso cuidado. Um desses mundos é o da interioridade. Muitos aproveitam as férias para descansar, mas e se aproveitássemos para pensar?
A nossa cabeça vive imersa em pensamentos todo o dia, todos os dias, mas a maior parte desses orienta-se para os que são momentâneos, prementes, úteis, necessários, e pensar em coisas profundas parece requerer um espaço que não se consegue encontrar no quotidiano. Porém, nas férias, em que o número de compromissos poderia diminuir para dar espaço ao lazer, quantas pessoas mantêm uma actividade frenética de visitar tudo e mais alguma coisa? Será que escondida está a incapacidade de nos libertarmos dos compromissos que nos dão a sensação de realização, mas que, na verdade, continuam a impedir-nos de vasculhar pela nossa interioridade de modo a arrumá-la um pouco?
O mundo está em permanente mudança, mas diante dos desafios grandes como as alterações climáticas e as divisões políticas que semeiam guerras sem sentido, ninguém pode ficar indiferente e achar-se demasiado pequeno para que uma sua transformação interior não produza reflexo no mundo exterior. O mundo é feito de relações e qualquer acto de amor gera um efeito em cadeia que não podemos alguma vez imaginar. Por isso, trabalhar a nossa interioridade para nos tornarmos pessoas profundas que aspiram a uma vida plena é crucial para as transformações que queremos ver realizadas no mundo.
Num sábado à noite, fui jantar com a minha esposa. Reparei no cansaço espelhado na cara dos empregados ao fim de um dia árduo de trabalho. Havia escrito nessa manhã algo sobre o valor transformativo do sorriso e pensei que seria o momento de aplicar o que havia reflectido. Assim, de cada vez que interagia com os empregados, seja no acto da escolha e pagamento do menu, como nos momentos de recolha da comida confeccionada, usei o sorriso para acolher gestos menos perfeitos devido ao cansaço na tentativa de que aqueles rapazes e raparigas experimentassem um pouco de amor. Desconheço totalmente o resultado, mas quando amamos não pensamos no resultado, mas no momento presente em que podemos amar. Quantas vezes pensamos neste tipo de coisas?
Para algumas pessoas, pensar pode dar muito trabalho e fazê-lo nas férias não parece ser uma opção de todo. Para outras, pensar pode ser o que mais fazem ao longo do ano, pelo que sugerir pensar nas férias pode levar a não descansarem de todo. Mas, e se considerássemos a hipótese de «pensar como acto de amor»?
Quando amei com um sorriso, incarnei um pensamento. E quando pensamos damos espaço à nossa interioridade para encontrar, na criatividade, quais os modos de converter um pensamento em acto de amor. Pensar como acto de amor pode ser uma actividade transformativa de lazer. Experimente.
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