Opinião
09 janeiro 2023

A vinda

Tempo de leitura: 4 min
Esperar a vinda, de dias, de pessoas, de Deus... é uma palavra-chave da maneira de viver dos cristãos.
P. Fernando Domingues
Missionário Comboniano
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Esperar a vinda, de dias, de pessoas, de Deus... é uma palavra-chave da maneira de viver dos cristãos. Quem não gosta de chegar a qualquer lado e escutar uma voz amiga que diz: «bem-vindo!» E todos já vivemos a alegria de estar à espera de alguém, que vai chegar de viagem; basta olhar para os rostos de alegria e ansiedade de quem está nas chegadas do aeroporto procurando ver se chega a pessoa que viajou. E quando a pessoa finalmente aparece o rosto de quem a espera ilumina-se, a alegria dos abraços. E para quem chega, a emoção de encontrar alguém querido que está à nossa espera.

A chegada próxima de alguém que vem fazer parte da nossa vida – um bebé – transforma a nossa maneira de viver. Talvez seja por isso que em algumas culturas africanas, os nascituros – aqueles que hão-de nascer – são já vistos como parte da nossa vida, parte da família. Também neste Natal que acabámos de celebrar alguém nos desejou «que seja Natal todos os dias do ano». Viver cada dia acolhendo a vida nova que Deus nos vai oferecendo. No Natal festejamos a vinda de Deus «à nossa carne» – «A Palavra (Verbo) de Deus se fez carne e habitou entre nós» (João 1,14). A partir daí, Deus pode tornar-se presente e nós podemos recebê-lo na «nossa carne», em tudo o que constitui a nossa vida quotidiana.

Ser cristão é viver na expectativa de Deus que está a chegar e vem ao nosso encontro. Um pensador cristão do século xx, J. Moltmann, gostava de dizer que a vida vem do futuro que Deus tem para nós, e por isso escreveu a Teologia da Esperança. Os cristãos não vivem para conservar o passado, seja ele glorioso ou triste, mas para receber o futuro que vai chegando em cada novo dia: Cristo que já vive na plenitude da vida, vem até nós para preencher a nossa sede e fome de vida plena. Configurar o nosso viver, não apenas como consequência do passado, mas como abertura ao futuro que Deus nos oferece e está sempre disposto a construir connosco.

O Advento nasceu no século iv quando os cristãos já não precisavam de escapar à perseguição e começaram a olhar para a frente e fazer da vida uma preparação para encontrar sempre de novo o Cristo que está à nossa frente e vem ao nosso encontro. Advento – a vinda – é um convite a viver o dia de hoje ao encontro de Cristo que está já no nosso amanhã. E cada novo encontro, em cada Natal, olhamos para a frente com o desejo de que cada dia do novo ano seja Natal, que em cada dia possamos renovar a alegria de acolher a Deus que vem ao nosso encontro.

Essa plenitude que está à nossa frente, e vem ao nosso encontro, Jesus gostava de lhe chamar Reino de Deus, uma situação em que as pessoas vivem e convivem com Ele, no amor para o qual nos criou. E Jesus gostava de comparar essa nova situação não a um celeiro cheio de colheitas do passado, mas a uma sementeira sempre a germinar para fazer crescer plantas novas que prometem frutos saborosos para os dias que hão-de vir (Marcos 4,26-34). Pensando nos tempos de Jesus, os antigos profetas gostavam de prometer: «Dias virão... que das espadas farão relhas de arado para cultivar a terra e das lanças forjarão foices para a colheita...» (Isaías 2,1-5). Cristo vem do futuro, ao nosso encontro, e nós vamos avançando cada dia, rumo a esse futuro que Deus tem para nós.   

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