Opinião
17 maio 2023

Comunicar é mais do que informar

Tempo de leitura: 4 min
Quem comunica, comunica-se. E comunicar a partir de uma informação implica partilhar um pouco de nós mesmos.
Miguel Oliveira Panão
Professor universitário
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(© 123RF)

 

Os nossos grupos vão para lá dos amigos que nos estão próximos, colegas de cursos, comunidades religiosas ou movimentos eclesiais a que pertencemos. Hoje, através de redes sociais ou aplicações como o WhatsApp, pertencemos a muitos outros grupos de interesse. Esta proliferação de grupos expressa o desejo natural de estarmos em comunhão uns com os outros, mas algumas experiências suscitam a dúvida se, realmente, estaremos a comunicar, ou antes a partilhar informação sem qualquer consequência para a comunhão entre nós. E pode acontecer que isso leve a uma certa fadiga relacional.

Existe uma distinção entre partilha de informação e comunicação. Um jornal digital partilha informação com o propósito de dar a conhecer o que se passa no mundo a quem estiver interessado. Quando partilhamos essa informação num grupo de WhatsApp, será que as pessoas estão seguras de que a partilha de informação interessa a todos os membros do grupo?

No início da experiência deste tipo de grupos, por serem novidade, ninguém sabia bem que dinâmica e influência teriam na nossa vida. Hoje, sentimos e sabemos como a quantidade excessiva de informação trocada pode levar a um estado de saturação e o conteúdo mais profundo coexistir com a informação mais banal. O resultado pode ser deixarmos de comunicar, diferente de partilhar informação.

Na comunicação partilhamos o efeito transformativo que a informação produziu em nós, na esperança que essa produza o mesmo efeito nos outros. Por isso, quando se partilha uma informação com intuito comunicativo, não basta enviar o link, importa partilhar a razão do envio de informação. Quem comunica, comunica-se. E comunicar a partir de uma informação implica partilhar um pouco de nós mesmos, seja pelo pensamento que tivemos, as perplexidades, dúvidas ou ainda as nossas experiências.

A partilha de informação inconsequente (só porque posso) leva-nos a uma fadiga relacional por sentirmos estarem a prender muita da nossa atenção com pouco. Na prática, não desejamos mais receber mensagens de quem parece fazer de nós um depósito de informação daquilo que “lhe” interessa, sem qualquer noção da razão pela qual está a partilhar aquela informação. E o conteúdo da própria informação começa a perder o interesse. Qualquer excesso leva sempre à obesidade que, neste caso, é informacional, diminuindo, gradualmente, a nossa capacidade de comunicar.

Trocamos mais informação do que comunicamos o efeito que essa produz em nós. Pensamos que o motivo que nos despertou a atenção irá, certamente, despertar a atenção do outro. Aliás, o outro nada mais tem a fazer do que esperar por toda e qualquer informação que eu quiser partilhar com ele. O mundo não funciona assim.

Quando partilhamos algo acompanhado das razões de termos partilhado e, se possível, a razão de o estarmos a fazer para aquele grupo, pode gerar alguma fricção por termos de pensar na experiência que fizemos com aquela informação, mas estaremos a comunicar melhor e isso valoriza tanto o próprio quanto o outro.   

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