Opinião
26 junho 2023

Ser monge na cidade

Tempo de leitura: 3 min
Existem sete aspectos onde a vida monástica poderia ajudar-nos a descobrir, gradualmente, o modo de sermos espiritualmente criativos.
Miguel Oliveira Panão
Professor universitário
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(© 123RF)

 

Uma vida urbana atarefada parece retirar espaço ao desenvolvimento da nossa criatividade espiritual. Por outro lado, as mutações sociais poderiam estimular uma renovação das práticas espirituais que nos levam a ser mais criativos. Porém, a vida espiritual não se alimenta apenas das nossas crenças e das justificações das mesmas, mas de um contínuo crescimento da vida interior. Será viável uma vida monástica capaz de renovar a vida interior em contexto urbano?

Nos contextos da produtividade e reflexão sobre o efeito da tecnologia na experiência de vida que fazemos, têm surgido diversos temas que sempre fizeram parte da vida monástica. Existem sete aspectos onde a vida monástica poderia ajudar-nos a descobrir, gradualmente, o modo de sermos espiritualmente criativos.

Vida Simples. Os monges adoptam uma vida de simplicidade e evitam excessos materiais. Nas cidades, a simplicidade traduz-se em práticas de minimalismo, como possuir apenas o necessário e evitar o consumo excessivo.

Meditação. A meditação é uma prática comum na vida monástica que ajuda a promover a paz interior e a clareza mental. Numa viagem de comboio, uma forma de meditar seria ler textos mais profundos e aproveitar as caminhadas pela cidade para pensar.

Serviço. O serviço aos outros caracteriza muitas comunidades monásticas e faz parte da dinâmica comunitária. Nas cidades, o voluntariado cresce com as assimetrias sociais, abrindo oportunidades para as práticas de bondade e generosidade. Um ouvido que escuta pode valer mais do que uma moeda.

Rotinas. A vida monástica é frequentemente estruturada em torno de uma rotina de oração, trabalho e repouso. Uma mudança de atitude mental diante das rotinas até chegar ao trabalho e depois do trabalho implica encarar que a regularidade ajuda a promover a produtividade e o bem-estar.

Silêncio e Solitude. O silêncio e a solitude valorizados em muitas tradições monásticas parecem ser impossíveis de viver num mundo urbanizado e conectado. Porém, apesar do ruído e multidão exterior, nada nos impede de encontrar o momento para o silêncio e solitude no nosso interior. Nem que seja a olhar para o chão do transporte público que nos leva para casa e deixar os pensamentos vaguear pela mente.

Estudo Contínuo. Muitas tradições monásticas valorizam o estudo contínuo, seja de textos religiosos, filosofia ou outros campos de conhecimento. Na sociedade da informação, aprender ao longo da vida é uma possibilidade acessível a todos. Basta crescer na sabedoria de distinguir facto de ficção.

Consciência e Respeito pela Natureza. O fumo dos carros e o ruído de fundo de que somente nos damos conta quando saímos da cidade pode dificultar a tomada de maior consciência da ligação que temos com o mundo natural, de modo a respeitá-lo e contemplá-lo. Procurar coisas novas e naturais pode ser o primeiro passo para descobrir a presença da Natureza onde menos esperamos, criando momentos de aproximação dessa que podem suscitar mais momentos de criatividade espiritual inesperada. 

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